Fugas - Viagens

  • A arte de Robalo II
surpreendeu quem
se passeou nas imediações
do Jardim da Avenida
João Cruz, em Bragança
    A arte de Robalo II surpreendeu quem se passeou nas imediações do Jardim da Avenida João Cruz, em Bragança Miguel Nogueira
  • Miguel Nogueira
  • Miguel Nogueira
  • Miguel Nogueira
  • a Fraga
da Pegada
    a Fraga da Pegada Miguel Nogueira
  • Miguel Nogueira
  • Na Fraga
da Pegada
    Na Fraga da Pegada Miguel Nogueira

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Trás-os-Montes

Continuamos na freguesia de Santa Combinha, passamos a aldeia (centro recuperado, por iniciativas privadas e capela de xisto feita rotunda à entrada), para chegarmos ao ponto de partida — e chegada — da sua Estação de Biodiversidade, um miradouro com loja de artesanato que há-de abrir. Estamos diante do Cabeço do Fidalgo, a única ilha da albufeira, miradouro perfeito para ler a sinuosidade das margens da albufeira, com penínsulas, reentrâncias e esconderijos, acolchoadas de arvoredo (onde abundam carvalhos e sobreiros) e vegetação arroupadas com as cores desmaiadas de Inverno sobre o fundo verde dos vales. Por instantes, somos transportados para as Terras Altas escocesas mas logo distinguimos a serra de Borne em frente onde já houve voos de parapente.

Não percorremos os 2,6 quilómetros (circulares) da estação que oferece como maior atractivo a concentração de espécies de borboletas: 43 das 135 diurnas conhecidas em Portugal continental — e não andam sozinhas: libélulas e libelinhas são a companhia mais comum, mas as referências nos painéis informativos ajudarão a identificar (quase) toda a fauna e flora que se cruzem no trilho. Não nos cruzamos com fauna e flora mas com a arte de José Augusto Pinho Carvalho, o Zé, que há anos trabalha a pedra e dela extrai imagens destas paragens, incluindo aldeias inteiras como aquela que vemos em exibição na loja de artesanato. Há casas, casinhas e casarões, igrejas com altares e virgens, castelos e moinhos, pontes e pastores de ovelhas, juntas de bois com carroças e caminhos-de-ferro — e porque o Natal está a chegar presépios de xisto. “É um dom que Deus me deu”, diz Zé, 45 anos de idade, 31 a usar o “dom”. Começou com lodo e musgo, “quando andava com os animais”, e foi aperfeiçoando. Agora trabalha com xisto, lousa e madeira de castanho — uma das primeiras casas que fez com estes materiais, casa abastada, grande, tem lugar de honra na loja. Quando deixou a escola, aos 14 anos, para ajudar os pais na agricultura, aproveitava as noites, “trabalhava com uma navalha até à meia-noite, uma hora”. “Deitava-se sempre muito tarde”, confirma a mãe, Maria Rosa Pinto, olhos azuis profundos. “E continua a fazê-lo”, queixa-se. “Sou o mais novo e o mais antigo [dos artesãos], os outros começaram mais velhos”, afirma Zé — e o resultado é vendido na loja, juntamente com outros objectos como fisgas ou máscaras.

De máscaras se faz a fama de Podence, à boleia do seu Entrudo chocalheiro. Em três semanas a aldeia vai viver os seus quatro dias mais agitados — “a vida são dois dias, o Carnaval são três, menos em Podence que são quatro” —, o seu principal cartaz turístico que é também uma das suas mais enraizadas tradições (diz-se herança das antigas saturnais romanas). Podence vai encher-se de multidões e entre elas vão soltar-se os caretos, “demónio, bicho ou macho”, lê-se na apresentação da Casa do Careto, que interrompem os “longos silêncios de cada Inverno” com o objectivo de apanhar as raparigas para as chocalhar. No resto do ano, o Entrudo chocalheiro sobrevive na Casa do Careto, onde vemos os trajes (grosseiros, como colchas franjadas de lã vermelha, verde e amarela), encimados pelas máscaras (nariz bicudos, de latão, madeiras ou couro) e completados por chocalhos e bandoleiras, que emprestam a quem os envergam poderes que os elevam acima do bem e do mal. Aí estão também as marafonas, as únicas mulheres que escapam às investidas dos caretos e os teares onde os fatos ganhavam forma. A completar a sala de exposição permanente, a série de telas de Graças Morais que a preto e branco recriam a tradição do Entrudo de Podence — a contrastar, a tela de Amadeo de Souza Cardoso, traços coloridos a desenhar um careto.

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