Fugas - Viagens

  • A arte de Robalo II
surpreendeu quem
se passeou nas imediações
do Jardim da Avenida
João Cruz, em Bragança
    A arte de Robalo II surpreendeu quem se passeou nas imediações do Jardim da Avenida João Cruz, em Bragança Miguel Nogueira
  • Miguel Nogueira
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  • a Fraga
da Pegada
    a Fraga da Pegada Miguel Nogueira
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  • Na Fraga
da Pegada
    Na Fraga da Pegada Miguel Nogueira

Trás-os-Montes

Por Andreia Marques Pereira

O pretexto foi o congresso Smart Travel 2014, os encontros foram inesperados. Fizemos uma viagem aos primórdios da Terra, seguimos o rasto dos cavaleiros da Ordem de Malta, tivemos iniciações gastronómicas imprevistas e descobrimos 'street art' em locais insuspeitos. Entre Macedo de Cavaleiros e Bragança vimos o nordeste transmontano igual ao de sempre, mas com novos olhos.

Quando chegou a Bragança, vinda de Londres, onde vive, Zabou já trazia os stencils prontos e menos de dois dias depois aqui estamos, vista para o Instituto Politécnico de Bragança e Home Street Home diante de nós. “É pobre”, explica uma mãe ao filho, num passeio matinal domingueiro. Pobre é a rapariga que dorme no muro pintado por Zabou com um cenário urbano por trás — inspirado pelo casario da Ribeira portuense, que a artista francesa viu apenas em fotografias. “Se pudesse alterar alguma coisa seria a cor dos telhados”, nota, “percebi que aqui são sempre vermelhos”. No mural, de oito metros, o maior que Zabou, 24 anos, já pintou, a paleta de cores varia entre o azul, o branco e apontamentos de amarelos (incluindo alguns telhados) — e não é por acaso. A sem-abrigo representada dorme enrolada numa bandeira da UE, a perversão do home sweet home. “É uma afirmação política”, assume a artista. Pareceu-lhe adequado a este trabalho, aqui, nesta região rural, neste momento, de pobreza galopante. “Muitas pessoas, incluindo amigos meus, tiveram de emigrar ou estão a debater-se com situações muito difíceis. A crise atingiu a Europa fortemente, sobretudo no sul, em países como a Grécia, Espanha, Itália e Portugal.”

Em Bragança está no norte do sul, está no interior de Portugal, onde pouco mais de um fim-de-semana bastou para que duas obras de street art se instalassem. “Espero que ajude a mudar um pouco o dia-a-dia das pessoas”, sublinha Zabou, “é importante mudar o cenário, as pessoas vão interagir de maneira diferente”. “Tinha um pouco de receio, mas as pessoas parecem acreditar no que estamos a fazer”, continua. O plural para incluir Bordalo II, o outro street artist que trabalhou em Bragança por estes dias. Na órbita do Jardim da Avenida João da Cruz, em frente ao centro comercial, já se distingue o que Bordalo II está a montar na parede, um lagarto gigante. Um dia depois ficaria pronto: o lagarto de língua estendida a apanhar um insecto — impacto visual imenso.

De tudo o que esperávamos encontrar em Bragança, dois murais de street art não estava na nossa lista. E, no entanto, este fim-de-semana, o primeiro de Dezembro, os sprays de tinta comandam a minimaquilhagem com que a cidade transmontana se travestiu à boleia do Smart Travel 2014, um congresso organizado para debater a questão dos “Destinos Inteligentes” em territórios de baixa densidade populacional. Entre Bragança e Mirandela decorreram as sessões com convidados de todo o mundo que vieram partilhar conhecimento e experiências de como potenciar recursos endógenos combinados com a tecnologia e outros processos inovadores para promover e desenvolver soluções inteligentes no turismo. E, depois da teoria dos dois primeiros dias, a prática nos dois últimos dias — e isto é o mesmo que dizer, as experiências de descoberta da região. O nordeste transmontano como um organismo único, onde a paisagem e a cultura, o folclore e o património, sem esquecer a mesa farta destas paragens, se entrelaçam numa mesma matriz e se alimentam mutuamente, numa simbiose cuja origem se perde no tempo.

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