Fugas - Viagens

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Há Almagro, há Almodóvar e há Volver

No filme, é precisamente na Federico Relímpio, onde Pablo Peréz se instalou antes de se identificar com a analogia entre uma fotografia industrial e um presunto, cumprindo um percurso inverso ao de Pedro Almodóvar, tão associado à capital, que Agustina e Paula tagarelam, frente a frente. Na Plaza Mayor, tal a sua dimensão, este diálogo entre as duas mulheres de Almodóvar seria impossível. Mas Almagro produz outros encantos, como a própria Federico Relímpio, resguardada no tempo, saudosista dos anos dourados, quando a cidade, beneficiando da prosperidade e poder da Ordem de Calatrava, se tornou capital de Castela-Mancha.

A praça e as beringelas

Recebendo, com gratidão, os raios do sol, tomo um café, de pé, vendo o mundo passar: um grupo de mulheres mascaradas – porque o Carnaval tem tradição em Almagro –, dois meninos que jogam à bola, bons executantes talvez sonhando com Messi e Cristiano Ronaldo, empregados e empregadas que, ainda sonolentos, vão abrindo as portas do comércio.

- Já provou as beringelas de Almagro?

Absorvido em meditações, nem dei pela presença, mesmo ao meu lado, do idoso que palitava os dentes com um fósforo.

- Mas olhe que nos restaurantes não encontra nada parecido com as minhas. Vou todos os anos a França visitar a minha filha, não me pergunte como se chama o lugar onde ela mora, a memória começa a falhar e as línguas estrangeiras não são o meu forte. Mas vou carregado com beringelas, nada de químicos, ninguém lhes põe a mão a não ser eu.

A praça começava a encher-se de vida. O proprietário do restaurante, situado nas minhas costas, talvez percebendo a minha atrapalhação ou julgando-me incomodado pela presença de um estranho, veio na minha direcção.

- Agora, no Inverno, não há muita gente mas volte a Almagro no Verão e vai ver como a cidade se enche de turistas. No mês passado, estiveram aqui uns catalães a jantar e sabe o que me incitaram a fazer? A sair para a rua e a pressionar os potenciais clientes, de preferência arrastando-os por um braço para o interior do restaurante. Diziam-me eles que, agora que a crise parece instalada, é assim que se procede em Barcelona.

O idoso, mordendo o lábio, olhava o dono, como quem espera uma aberta depois de um aguaceiro para voltar ao tema das beringelas, o sol da sua vida. Um pedia-me para regressar após a Primavera, o outro ansiava por voltar à temática das beringelas.

Volver

A cidade instituiu, há já algum tempo, com o apoio do Conselho Municipal do Turismo, a Rota das Tapas da Beringela de Almagro, uma iniciativa que pretende promover o “legume mais universal” da urbe e que foi acolhida por bares, restaurantes e hotéis, um esforço colectivo dos sectores privado e público que convida os turistas a errar por cada um dos estabelecimentos participantes e a avaliá-los, de 1 a 10, num folheto que deverá ser assinado e que, depois de devidamente preenchido com os dados pessoais, dá acesso automático a um sorteio cujo prémio consiste num jantar e alojamento num dos locais aderentes e numa visita guiada através dos Vulcões do Campo de Calatrava por Natureza Indómita e a todos os lugares turísticos de Almagro.

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