Fugas - Viagens

  • Mara Carvalho
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O povo desenha um jardim de papel em cada rua

Chamam-se Festas do Povo porque só são possíveis com o trabalho voluntário do povo na decoração das ruas e, por isso, só acontecem quando o povo quer. Quando o “bichinho das festas” ataca a alma da população raiana e a memória da alegria vivida naquela semana suplanta a lembrança de meses a fio onde cada hora livre é feita de papel, arames e cola. Ao longo dos meses, o entusiasmo e o cansaço vão-se sucedendo, mas o espírito nunca se resigna ao repto do “que estiver feito põe-se na rua”, garante Hermínia Bicho, na Rua Major Talaya. “Cada rua quer ser sempre mais bonita do que a outra.”

Nascer nas flores

As primeiras festas de que Teresa se lembra foram em 1985. Tinha quatro anos. Nas seguintes, em 1989, “já era mais velhinha”, cortava papel, fazia torcidos, ajudava nos trabalhos mais simples. “A minha mãe foi cabeça de rua durante mais de 30 anos na Rua da Lagoa, andávamos sempre atrás dela”, recorda. “Fomos criadas no meio das flores.”

Para Liliane, hoje com 11 anos, foi por pouco que a expressão “nascer nas flores” não se tornou literal. A mãe, natural de Lisboa, participava nos preparativos da festa pela primeira vez, dava voltas ao papel sobre o regaço inchado quando as águas rebentaram. “Foram as outras vizinhas que me levaram para o hospital”, conta Helena Teixeira. “Na rua ainda lhe chamam ‘florinha’.”

Naquele ano, o tema da Rua General Magalhães era o arco-íris, nunca se há-de esquecer. Desta vez, há quadros inspirados nos tapetes de Arraiolos. Mais de 2000 flores pequeninas dão forma a cada uma das 18 telas, idealizadas por Cristina Monho, cabeça de rua. Na vila, a expectativa é grande com a antiga Rua de Nantio. Já correu o rumor dos tapetes, há curiosidade para ver o resultado final durante as festas. Depois de alguma insistência, Domingas Monho lá nos deixa espreitar. Traz dois exemplos que a nora já terminou envoltos em sacos pretos opacos. Nesta rua, a tradição do segredo ainda é levada a sério. Mas muita coisa mudou, todos nos dizem, divididos entre o saudosismo do passado e a constatação de que agora as decorações estão provavelmente mais bonitas.

“Ainda me lembro de andar com uma latinha a bater às portas com a minha mãe, a pedir o dinheiro da semana”, recorda Teresa. Antigamente eram os moradores que pagavam os materiais, doavam 20 ou 30 escudos de cada vez. A cola era feita com água, farinha e vinagre. Agora é a Associação das Festas do Povo que disponibiliza tudo. Do orçamento de um milhão de euros, metade é gasto na compra dos materiais. “São cerca de 30 toneladas, entre papel, madeiras, arames, colas, fios, cartolinas e cartões”, indica João Rosinha, presidente da associação.

Tal como aconteceu na última edição, em 2011, há pessoas contratadas para fazer flores durante os meses que antecedem as festas. Este ano são 90, sobretudo mulheres vindas do fundo de desemprego. Encontramo-las divididas pelas salas das antigas escolas primárias no centro da vila, nas garagens dos grupos mais atrasados. Muitas trabalham de manhã para as outras ruas e o resto do dia para as suas. “Começou-se a pagar para fazer e acho que já não se volta a fazer sem pagar. Se não for a ajuda deles é impossível, porque a malta nova, zero”, defende Teresa.

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