Fugas - Viagens

  • Adriano Miranda
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Brindar o Ano Novo com poncha

O turismo, desde sempre

É uma arte urbana, contemporânea, num cenário centenário. Para andar no Funchal de agora percebendo o Funchal de outrora, pode recorrer ao projecto “History Tellers - walk with real stories”/ Contadores de História – caminhar com histórias reais. A iniciativa é da Associação Académica da Universidade da Madeira (AAUMa): um modo de divulgar o património, mas também de fazer dinheiro para ajudar os estudantes mais carenciados. Os cinco euros pagos por cada visitante revertem para um fundo que é usado em bolsas de alimentação (refeições) e bolsas escolares (material escolar).

“Inspiramo-nos um pouco nos jesuítas”, diz Carlos Alexandre Martins, responsável pela divulgação do projecto. A reitoria funciona no antigo colégio dos jesuítas e foi lá que começaram estas visitas guiadas — em português, inglês, francês, polaco e grego. “Recorremos a voluntários da região, alunos da Universidade da Madeira, e a voluntários de fora, através do Serviço Voluntário Europeu.”

Segui o estudante Carlos Diogo por largos, ruas, travessas, becos. E pela sua voz fiquei a saber, por exemplo, que, nos séculos XVI e XVII, na Rua de Santa Maria sobravam oficinas de carpintaria dedicadas a fazer as afamadas caixas-de-açúcar. Ele mostrou-me coisas que eu já conhecia, como a capela do Largo do Corpo Santo, no largo homónimo, tantas vezes usada para amparar homens do mar e suas famílias. E coisas nas quais nunca tinha reparado, como a escultura que recria Maximiano de Sousa, mais conhecido por Max, no Almirante Reis, salpicada pelas excrementos das gaivotas.

Se quiser fazer uma caminhada destas, lembre-se que o ponto de partida é o Armazém do Mercado, com entrada pela Rua do Hospital Velho, a uns minutos do tradicional Mercado dos Lavradores: dois edifícios foram fundidos e transformados num espaço de cultura urbana, com uma componente comercial, que passa por lojas, quiosques, mercadinhos, concertos, workshops.

Márcio Nóbrega também anda por ali. São dele a hamburgueria e restaurante italiano que dão para a outra rua. E o primeiro hostel da ilha, um pouco abaixo, na Rua de Santa Maria. Já foi uma escola primária no Estado Novo. Havia a escola primária masculina e a escola primária feminina. A feminina, claro, era bem mais pequena. Entre ambas havia um muro. O empresário pensou em fazer um clube de gin e um armazém, mas ficou deliciado com o edifício. Recuperou-o. Preservou os pés direitos enormes, os telhados vigados a madeira, os tectos em caixote, típicos da região. Fez um “beer, wine and gin bar”, um restaurante de peixe, marisco e sushi e um hostel. Diz que encontrou alguma resistência. “A Madeira tem aquela imagem do turismo de sandálias, de idosos que não saem dos hotéis”, disse ele, sem esconder desgosto. “Também tem turismo ligado ao desporto de aventura. Esperemos que a abertura seja para aí. Havia uma acomodação…”

O turismo, na Madeira, é quase tão antigo como o povoamento. Já no século XVII se falava em “turismo de quarentena”. A ilha foi uma instância de repouso de funcionários ingleses vindos da Índia, necessitados de se adaptarem ao horário e ao clima da Europa. E também um sítio para os passageiros esticarem as pernas. Dizem os estudiosos que a actividade mais a sério começou já no final do século XVII, com o “turismo terapêutico”. Por ali passaram figuras da cultura, como António Nobre e Júlio Dinis, e militares, nobres, como a imperatriz austro-húngara Sissi ou a imperatriz do Brasil dona Amélia. O chamado turismo industrial é coisa do século XX. Desenvolveu-se, sobretudo, a partir da década de 50, com a inauguração do aeroporto, em Santa Cruz. Isto não me saiu do nada. Andei a ler História da Madeira, de Rui Nepomuceno.

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