O luxo é uma coisa antiga que rola sobre carris. Desde que Coco Chanel o identificou por contraponto à vulgaridade e não à pobreza, o luxo é uma sensação sem limites. Sobretudo quando viajamos Douro acima numa composição ferroviária do século passado e somos mimados pela cozinha mais prestigiada do país. Sim, o Vila Joya no Douro é uma viagem a todos os títulos inesquecível, mas também é um daqueles raros momentos de luxo no seu mais actual e descomprometido entendimento.
Gilles Lipotevsky concluiu que, longe da ostentação, das jóias ou objectos caros, o luxo actual passa antes por conseguir “comprar” emoções. E o filósofo bem poderia ter recorrido a este mergulho no passado, na natureza, e na alta gastronomia para explicar a sua teoria. À emoção gastronómica junta-se a impressionante paisagem do Douro, seus vinhedos e vinhos, e um comboio que foi de monarcas e chefes de Estado e agora podemos ver e tocar.
Luxo é também poder ter representantes da nova geração de portugueses como Gonçalo Castel-Branco, que gostam apaixonadamente daquilo que de melhor tem o país e fazem por mostrá-lo e partilhá-lo. Apaixonado por comboios antigos desde que atravessou os EUA numa velha composição, salta-lhe ainda agora o entusiasmo quando fala na descoberta do Comboio Presidencial.
A ideia era outra e passava pela música, com concertos a bordo de velhas carruagens. “É fabuloso, só é pena que não ande”, disse, num lamento que logo ali virou desafio. Não só andava, como tinha acabado de ser restaurado e qualquer pretexto era bem-vindo para lhe dar uso. Foi a filhota, Inês, 11 anos, que com o seu entusiasmo pela cozinha soltou a palavra mágica: “Com comida.”
A partir daí é, de facto, a emoção que comanda o projecto. Com um tal cenário, tudo teria que ser ao nível do melhor que há no país.
O Vila Joya, com duas estrelas Michelin consecutivas há uma dúzia de anos e o único restaurante português com destaque na lista dos melhores do mundo, era obrigatório. O mais complicado era convencer o chef, o circunspecto Dieter Koschina, a cozinhar no comboio. Nada de explicações. A conversa tinha que ser em local especial. E lá foram, de carro, até ao Museu Nacional Ferroviário, no Entrocamento.
O cozinheiro ficou de queixo caído e tudo aquilo que à partida seriam dificuldades, virou puro desafio. “Fiquei fascinado. Pensei logo nos cenários do Expresso do Oriente ou nos filmes de John Wayne em todo aquele charme de estilo clássico para uma bela refeição.” A mesma estratégia foi seguida com os restantes parceiros. A proposta era lançada com a visita ao comboio e logo aí todas resistências ficavam por terra.
Cenário imponente
É no cenário imponente da estação de São Bento, no Porto, que tudo começa. Os painéis de azulejos da centenária estação serão hoje em dia os objectos mais fotografados do país, mas pelas 11h os numerosos grupos de turistas orientais descobrem também as carruagens azuis do Comboio Presidencial e disparam freneticamente na tentativa de registar imagens de todos os ângulos. Nota-se algum desencanto quando descobrem que a viagem é ocasional.