Fugas - Viagens

  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro

Multimedia

Mais

Ver mais

Continuação: página 4 de 9

Era uma vez na Arménia

Sinto-me grato perante tamanhas manifestações de beleza: da montanha, do vale aos seus pés e das palavras e dos sentimentos da jovem de cabelos negros.

- Eu nunca vi nada mais bonito na minha vida. Mas sempre que olho o Ararat, penso em todos aqueles que estão em cativeiro, na sua dor; e acredito que a minha montanha sagrada vive também com essa dor. 

Com um entusiasmo que contagia, retoma a história de Khor Virap.

- Diz a lenda que um dia o rei se transformou num porco e, pouco depois, a irmã do soberano teve um sonho no qual um anjo enviado por Deus lhe assegurava que apenas Grigory seria capaz de ajudar o irmão. Grigory foi levado à presença do rei e, graças às suas orações, obteve a cura para os seus males.

Regresso ao interior do mosteiro e a jovem, de 19 anos, garante-me que ainda fica por ali, até que a noite caia, com as suas memórias de visitas a Khor Virap, que terá todo o prazer em partilhar comigo, se for essa a minha vontade.

- E não quer mesmo jantar connosco? Seria uma honra para os meus pais.

Nos pisos abaixo do solo, com as suas paredes e tectos escurecidos pelo fumo, as velas ardem e a fé dos crentes alimenta-se. Pelo menos desde o século VI que são alvo de renovações, enquanto a igreja Surp Astvatsatsin, a principal estrutura do complexo religioso, data do século XVII. Imperdível, depois de escutar Tatev Sinanyan, é a descida ao poço que, embora iluminado, requer alguns cuidados — são sete metros através de uma escada de metal. 

À distância, avisto Tatev Sinanyan, sentada onde a deixara.

- Não é difícil, pois não? Eu, sempre que desço ao buraco, experimento a sensação de que não há mais terra sob os meus pés, sinto grande dificuldade em respirar e imagino a dor dos meus antepassados quando eram perseguidos devido às suas crenças.

Há uma única turista, de nacionalidade suíça, entre a multidão de arménios banhada por uma aura de felicidade que, pelo menos ao olhos de um estrangeiro, tem algo de enigmático. Khor Virap é um local onde as tristezas se esquecem e quase todos, com tantos gestos pueris, parecem devolvidos à sua adolescência, vivendo uma vida que não é a deles.

- O meu vocabulário é demasiado pobre para descrever a sensação de visitar Khor Virap. Venho aqui uma ou duas vezes por mês e sinto sempre a presença de Deus, que posso comunicar com Ele. Creio que há um poder sobrenatural que estabele uma ligação entre as pessoas e Deus. Aqui, sinto-me em paz.

Os pais de Tatev Sinanyan casaram-se em Khor Virap, ela e o irmão aqui foram baptizados; cumprindo a tradição, a jovem visitou o mosteiro no dia da sua graduação, por vezes escapava-se, juntamente com as colegas, das aulas e desfrutava de algumas horas em Khor Virap e ainda se lembra dos sábados e domingos em que assistia, de olhos muito abertos, aos movimentos delicados de um acrobata numa corda suspensa. A memória mais fresca prende-se, porém, com a visita do Papa Francisco, em Junho deste ano.

- Próximo da igreja, o Papa fez votos de paz em direcção ao Monte Ararat, como fizera Noé desde a arca. 

--%>