Tinha passado por Espanha, por França, pela Bélgica, pela Holanda, pela Alemanha, pela Finlândia, pela Estónia, pela Letónia, pela Lituânia, pela Polónia, pela República Checa, por Itália, pela Eslovénia, pela Croácia, pela Bósnia-Herzegovina, pela Turquia, pela Rússia, pela China continental. Já se tinha apaixonado mais do que uma vez e uma delas muito a sério. Virara tudo do avesso por uma rapariga de Helsingborg, Sul da Suécia. E andava a sofrer por uma rapariga de Pequim.
Viajar era, também, iludir-se, desiludir-se, rejeitar, ser rejeitado, rir, chorar. E, naquela fase, pesava-lhe o desarranjo recorrente, a impossibilidade de permanecer, a obrigatoriedade de recomeçar, a consciência de que tudo se esvai. “Tenho medo de me relacionar com pessoas de forma forte.”
Era evidente que se sentia só. “Quando estás mesmo lá em cima, quando estás a ver o tipo de coisas que toda gente gostaria de ver, aparece-te a maior solidão porque não tens com quem partilhar”, constatava. “A minha vontade é ir por aí abaixo, correr tendas, conhecer pessoas, falar com elas. E sinto o choque cultural. A aceitação da rejeição vai moldando a forma como me relaciono. Protejo-me cada vez mais.”
Acreditara “que iria conseguir encontrar a sensação de ‘casa’, onde quer que estivesse.” E não era bem isso que estava a acontecer. “Estou num país que não é o meu e, da maneira como viajo, tento ser parte de um país e esse é o problema. Eu olho para Hong Kong e penso que sou daqui. E não sou. Neste momento, estou a enfrentar choques culturais quase diariamente”, revelava. Viajar é, também, lidar com preconceito. E ele era o europeu, o artista, o nómada, o aventureiro.
O que Luís já andara para ali chegar. Ainda se lembrava da reacção dos pais quando anunciara vontade de partir. “Eu todo feliz, cheio de energia para começar o projecto, a mostrar os papéis ao meu pai e ele: ‘Tá bem.’ Levantou-se e saiu. E eu: ‘Tá bem o quê? É só isso que tens para dizer?’ E ele: “Então é isso que vais fazer à tua vida?”. E eu: ‘Sim, é isso que eu quero fazer.’ Ele ficou uns segundos em silêncio e disse: ‘Isso é uma estupidez. Não tem pés nem cabeça. Pensas que tens vinte anos? Tem 32! Depois, quando regressares, o que vai ser a tua vida?’”
Ali, àquela distância, compreendia a reacção paterna: “Era como se estivesse a destruir tudo o que construíra até ali. Toda a gente imaginava que eu ia ser pai, ter filhos, engordar e, um dia, perder dentes, ficar sem cabelo. E acho que foi um bocado essa ideia que me assustou. ‘Sou novo de mais para me sentir tão velho!’”
A mãe também não achou graça à ideia. “A minha mãe ficou muito triste porque eu ia abandoná-la. O meu pai chegou a dizer-lhe que eles tinham que arranjar outro filho para me substituir, porque eu ia ficar fora tempo de mais”, recorda. Para parar aquele discurso, deixou de falar no assunto.
Decorreram meses até os pais começarem a manifestar interesse. Um dia, desafiaram Luís a almoçar e apresentaram-lhe uma proposta. Queriam ir com ele. Ele achou “ridículo”. ”Então agora vão andar pela Europa? ‘Olá, eu sou o Luís e estes são os meus pais. Tenho 32 anos e estou a viajar com eles e eles pagam tudo.”