- Tento, na medida do possível, passar o testemunho aos jovens, os da minha geração, da que me precede e da que agora desponta, garante Antonina Julienne, uma mulher a quem todos reconhecem um grande dinamismo.
Se, nos primeiros anos deste século, o Carnaval de Granville parecia condenado a perder a sua grandeza, a partir de meados da primeira década, graças a uma nova governação, ganhou um outro impulso e afastou, definitivamente, os sinais emergentes de uma certa negligência. O passo mais importante foi dado no Outono de 2009, quando a organização, contando com um forte apoio da comunidade local e dos habituais participantes no Carnaval, assim como da Fabrique de Patrimonies de Normandie (através do seu gabinete etnológico), decidiu apresentar o seu projecto de candidatura à UNESCO, de forma a salvaguardar as pequenas e as grandes tradições e de mais facilmente dar a conhecer ao mundo uma parte da sua diversidade cultural mas que não renega à evolução dos tempos.
Após ter percorrido as diversas etapas que são exigidas, o Carnaval de Granville foi finalmente seleccionado, na Primavera de 2016, pelo ministério da Cultura francês como o único dossier em todo o país para ser apresentado na sessão da UNESCO desse mesmo ano dedicada ao Património Cultural e Imaterial. A 30 de Novembro último, desde Adis Abeba, capital da Etiópia, chegava a notícia por todos aguardada na cidade: o Carnaval de Granville acabara de ser inscrito na lista representativa do Património Cultural e Imaterial da Humanidade.
Com um orçamento estimado em 200 mil euros, esperava-se que a conquista de um novo estatuto pudesse atrair mais patrocinadores ou mesmo motivar um maior investimento. Antonina Julienne contradiz esta teoria:
- Em concreto, nada vai mudar. É o reconhecimento de uma festa tradicional mas é uma relevância que produz efeitos apenas ao nível da população local. De resto, o espírito satírico e humorístico não sofrerá qualquer alteração, a tradição continuará a desenvolver-se, ainda que preservando os rituais obrigatórios.
As intrigas
O que Antonina Julienne pensa sobre a inclusão do carnaval na lista da UNESCO também se aplica à noite de terça-feira — é especial, é verdade, mas para os residentes ou para quem com eles está minimamente identificado. Mal o dia parte, as luzes começam a bailar sobre as águas do porto e vão piscando sobre o promontório, como se fosse um farol gigante anunciando aos pescadores que algo de muito importante está para acontecer. A esta hora, homens e mulheres, escondendo-se atrás das suas máscaras, saem para a rua sem pensarem, por um momento que seja, na hora do regresso. Sozinhos ou acompanhados, entram em bares, em restaurantes, nas casas dos amigos, todos se prestam ao jogo que é, sob a capa do anonimato, a noite das intrigas, divertindo-se por não serem reconhecidos, por poderem abordar pessoas com quem se cruzaram uma vez ou outra — nesta noite tudo é permitido.
- É algo de muito frágil que temos o dever de fazer perdurar porque foi em grande parte graças às intrigas que a UNESCO decidiu incluir o Carnaval de Granville na lista do Património Cultural e Imaterial da Humanidade. As intrigas são um momento à parte, de um outro tempo e que, pelo facto de durarem apenas uma noite, é importante aproveitar ao máximo.