Ao desenharmos um triângulo no mapa de Lisboa, com as extremidades a ligarem a Torre de Belém ao Padrão dos Descobrimentos, e a margem do Tejo a servir-lhe de sopé, fica apenas a faltar-nos um vértice. Se unirmos estes ângulos no n.º 65 da Rua Bartolomeu Dias afigura-se um triângulo escaleno. É esta a geometria ideal para traçarmos um plano e - ao contrário do heróico Bartolomeu -, navegarmos tranquilamente até um lugar que se "Descobre" no nome e no espaço.
A designação ambígua do restaurante podia ser facilmente associada à localização entre os dois símbolos que evocam a Época das Descobertas e ao facto de a morada ter como topónimo o navegador português que em 1488 foi pioneiro a dar cabo das tormentas que se faziam sentir no sul de África, quando o desafio era cruzar-se do Atlântico para o Índico. Afinal parece que o repto lançado aos clientes é que "descubram" produtos nacionais seleccionados e também algumas receitas que contam a história das epopeias portuguesas. Foi nessa boa esperança de encontrarmos novos sabores que nos dirigimos a Belém com o espírito de quem procura o "Descobre" (passe a cacofonia).
O estabelecimento tem duas valências e está instalado num prédio de traça pombalina. A entrada faz-se pela "mercearia", nome popular que se converteu em chique como se pode constatar pela sala aperaltada onde estão expostos vários produtos para venda directa, como compotas, especiarias, conservas, queijos, licores diversos, vinhos de mesa, mas também fortificados. Salta à vista a estante de madeira do lado direito que se funde na figura elegante de um tronco de árvore estilizado. Num cantinho desta sala, junto à coluna que faz de charneira aos quatro arcos de pedra que sobressaem de imediato na decoração, acede-se à agradável zona de refeições. Apresentação cuidada das mesas, boas cadeiras e um confortável banco corrido junto às paredes, com a costa a dissimular uma sanca percorrida por um fio de luz indirecta, o que torna o ambiente mais acolhedor.
A casa aposta num horário contínuo desde os almoços até à meia-noite. Doze horas seguidas de funcionamento, e sem folgas, que comportam uma carta onde se incluem sugestões diárias aos almoços (uma de peixe, outra de carne) e pratos mais elaborados, que podem igualmente ser pedidos ao jantar, além de uma forte vertente petisqueira. A sugestão de cerca de 20 petiscos tanto pode preencher as tardes, numa das mesas da entrada com um copo de vinho ali à mão, ou saciar apetites mais tardios que podem surgir no final de um espectáculo no vizinho Centro Cultural de Belém.
O couvert colocado na mesa começou por revelar algum critério na selecção de produtos e preparações. Um bom "Azeite Pia do Urso" (1,50 euros), também à venda na loja, uma "Pasta de azeitona" (1,20 euros) sem excesso de azeite a perturbar a percepção do fruto, e uma belíssima "Manteiga de mel com flor de sal em Touriga Nacional" (1 euro), uma preparação simples feita com boa manteiga, a ficar ainda mais gulosa e por isso a ter de ser "domesticada" pelos cristais de sal negros e com suaves notas vínicas. Tudo aperitivos para emparceirar com "Pão" (1,80 euros), que embora referido como feito na casa tinha qualidade banal.
Os primeiros petiscos vieram de duas secções da ementa apelidadas de "Pic"aqui, Pic"ali" e "Descobre as espetadinhas". Para "picar" há uma dezena de hipóteses que tanto podem ser umas ovas de sardinha em conserva, uns filetes de sarda com ervas ou galinha com alho. Despertou a atenção a "Pica de pato com canela" (8 euros), mas infelizmente não cativou. Os pedacinhos do pato, temperados com mostarda à antiga (com sementes) e especiarias, vinham a puxar para o rijo. Depois havia um sabor alimonado - quiçá de gengibre a mais - que dominava o tempero, o que ofuscou a anunciada presença da canela sem se perceber o resultado gustativo da ligação entre a ave e a especiaria. O "Queijo de ovelha caramelizado com doce de malagueta" (4,50 euros) é que deu mesmo gosto "picar", pois a ardência da compota revelava-se no palato por debaixo de um manto de doçura. O choque positivo do inusitado doce com a rodela do queijo (Herdade da Amendoeira - Alentejo), protegido pelos cristais da caramelização e a fundir no interior, fez um belo contraste de sabores.
- Nome
- Descobre
- Local
- Lisboa, Santa Maria de Belém, Rua Bartolomeu Dias, 65 e 69
- Telefone
- 218056461
- Horarios
- Segunda a Sábado das 12:00 às 00:00
Domingo das 10:00 às 00:00
- Website
- http://www.descobre.com.pt
- Preço
- 25€