Fugas - restaurantes e bares

Nuno Ferreira Santos

De olhos bem abertos... também para o vinho

Por Fortunato da Câmara ,

Está tão acessível quanto invisível. Escondida numa travessa da Rua de Belém há uma acolhedora enoteca que, bem vistas as coisas, é mais um restaurante agradável com um muito bom serviço de vinhos do que um wine bar. Ou seja, estamos perante um bom problema de identidade.

Numa qualquer zona de grande incidência turística, a localização de um negócio é preponderante para a sua viabilidade. Nalguns casos, 100 metros podem fazer toda a diferença e marcarem logo aí a curta distância de se poder ficar “encoberto”, sabendo que o sucesso está ao virar da esquina, e às vezes a céu aberto. Portanto, é natural pensar-se que estar a escassa centena de metros de um local de “peregrinação” gastronómica de Lisboa para comer pastéis de nata pode significar muito. Mas se falarmos que fica na Travessa Marta Pinto o muito volta a ser pouco — ou nada. 

Basta apenas sair algumas passadas da Rua de Belém para se dar com esta Enoteca de Belém. A casa abriu há mais de três anos e sem grandes alaridos lá vai tirando partido dos que por ali passam em direcção à célebre confeitaria da vizinhança. A porta fica absolutamente dissimulada para quem circula na rua principal, por isso convém estar de olhos bem abertos para se dar com o número 12 desta travessa quase invisível aos inúmeros passantes diários. 

Descoberta a entrada, chega-se a um espaço pequeno de ambiente agradável, onde sobressaem de imediato o pé-direito da sala e o tecto em abóbada semicircular feito com tijolo burro. A estante de madeira que reveste a parede direita é um vistoso escaparate de vinhos, alinhados em duas longínquas filas, uma para brancos e outra para tintos. 

A notícia de que não há carta de vinhos surpreende. As garrafas estão longe das mãos, é um facto, mas logo ficam perto da vista quando nos colocam sobre a mesa uns vetustos binóculos de estilo operático (versão homem e senhora). Passado o efeito surpresa, lá se distende o olhar pela escala de vinhos e as suas múltiplas notas e harmonias, antes de escolher o “andamento” vínico adequado à refeição. No que respeita a preços, a “música” é monótona. A esmagadora maioria das referências custa 22 euros a garrafa e 4,50 euros o copo, proporcionando uma diversidade de opções que deve ser sublinhada e enaltecida. Há um ou outro vinho premium que fica fora desta bitola. Armários climatizados, copos e temperaturas de serviço, tudo adequado aos pergaminhos de “enoteca”. No entanto, a casa tem um claro perfil de restaurante.

Os números da ementa não desmentem. Oito entradas onde se pode encontrar salmão com líchias e soja ou camarão com Portobello (cogumelo) e queijo da ilha. Oitos pratos principais onde constam atum com milho frito, agrião e poncha, ou arroz de pato cremoso, e ainda quatro sobremesas. É sem dúvida uma oferta de restaurante e com alguma ambição nas propostas. E lá chegaram os “mimos” (3,50 euros) de abertura colocados na mesa, que foram uma agradável manteiga de ovelha, azeitonas verdes banais com azeite e três tipos de pão (trigo, mistura e frutos secos) de qualidade regular. 

Com o Verão a fugir por entre os dedos lá fora, houve a tentação de escolher das entradas a “sardinha, gaspacho” (9 euros), este último em versão triturada (à andaluza), servido de um jarrinho para um copo com pedra de gelo. Tinha um sabor delicado, mas sem impressionar. Ao lado, uma “brunesa” (quadradinhos) de ingredientes típicos do gaspacho, como pimento (verde e amarelo) e tomate, além de uma inusitada curgete. Sobre o picado de legumes levemente escaldados, uma quenelle (forma de pastel de bacalhau) de mousse de sardinha de conserva, saborosa, mas um pouco inesperada quando este peixe de eleição da nossa costa está precisamente agora a atingir o auge de qualidade da sua época. Muito boa a qualidade do “carpaccio de novilho ao bitoque” (12 euros), com a peça do lombo moldada em forma cilíndrica e laminada em rodelas. Ao centro da rosácea de carne, um pouco de rúcula com batatas “rijadas” às rodelas (pré cozidas antes de fritarem), juntamente com uma deliciosa gema de ovo “a cavalo” a darem a composição de bitoque enunciada na lista. Uma ligação infalível foi o “figo, queijo de cabra, Porto” (8 euros), com os pequenos frutos de época cortados em gomos, dispostos sobre rúcula e com uma rodela de queijo chèvre versão XL caramelizada no topo num casamento que resultou muito bem. 

Nome
Enoteca de Belém
Local
Lisboa, Santa Maria de Belém, Travessa de Marta Pinto, 21
Telefone
213631511
Horarios
Terça a Domingo das 13:00 às 15:00 e das 19:00 às 22:00
Website
http://www.travessadaermida.com/
Preço
35€
Cozinha
Portuguesa
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