Já escasseiam as casas de marcenaria e móveis, Francisco Sá Carneiro é ainda memória e Camilo Castelo Branco já passou à história, mas a íngreme Rua da Picaria, no coração do Porto, mantém a traça centenária e o ar austero que dificilmente deixam adivinhar a revolução dos últimos tempos. Bares, restaurantes e galerias tomaram conta das lojas e caves graníticas, e agora tudo muda do dia para a noite.
Tudo menos o Ernesto, que com o seu estatuto quase centenário, cozinha tradicional cuidada e ambiente confortável e acolhedor se mantém como a referência gastronómica. É quase uma instituição o restaurante que abriu portas em 1938 e tem sabido acompanhar os tempos, mantendo uma cozinha com memória e a personalidade de sempre.
Foi certeiro o vaticínio traçado, em Dezembro de 2008, nas páginas do PÚBLICO: “Ainda se compram móveis aqui, mas sente-se nesta rua um sopro de modernidade que promete mudar a sua face nos próximos anos.” Aqui se mantém a casa onde Sá Carneiro nasceu, cresceu e morou, foi também na Picaria que Camilo viveu “o adultério” com Ana Plácido que os levaria à cadeia, mas as referências são hoje, de facto, os bares e espaços de restauração, das mais variadas tendências e estilos.
Também por isso o Ernesto acolhe agora uma clientela ecléctica. As famílias burguesas, os quadros e executivos de sempre, de par com jovens, artistas e intelectuais. Há trabalhos artísticos, de pintura, fotografia e escultura, que permanentemente decoram as paredes graníticas do restaurante, e uma envolvente contemporânea, que enquadra com a estrutura rústica e as traves de castanho antigo.
Na entrada, estreita, o balcão e parede de azulejos como evocação de outros tempos a dar passagem para as duas salas sobrepostas (rés-do-chão e primeiro andar) onde se acolhe aí uma meia centena de comensais. Com tempo de feição, o terraço e pátio interiores funcionam como prazenteira esplanada.
Mesas cobertas por alvas toalhas de algodão, louças brancas de sóbrio e elegante padrão actual e decoração a condizer. Pela carta desfilam os pratos tradicionais, como as tripas à moda do Porto, cozido à portuguesa, bacalhaus em várias preparações ou os assados de cabrito e vitela. Os peixes frescos variam, naturalmente, com a oferta de mercado. A meia dose chega em proporções generosas e os preços andam entre 6,50€ e 12,50€.
Depois do pratinho com queijo de vaca, salpicão do lombo em finas rodelas e rissóis de camarão (2,60€), sopa de legumes (1,80€) consistente a confortar o estômago. Pediram-se os filetes de pescada em meia dose (8€), com três lombos da dita impecavelmente fritos e escorridos, envolvência macia de ovo e farinha, sabor e textura afinados. Acompanhou com arroz de feijão vermelho, caldoso e de bago aberto, como manda a boa tradição nortenha.
Correcto e a honrar os pergaminhos o bacalhau à Gomes de Sá (7,80€), um prato do Porto que vai bem com a história e tradição do Ernesto. Sabor e envolvência a mostrar a qualidade da cozinha num prato que merecia umas lascas de boa cura para arrebatar o palato.
- Nome
- O Ernesto
- Local
- Porto, Vitória, Rua da Picaria, 85
- Telefone
- 222 002 600
- Website
- www.oernesto.com
- Observações
- Fecha ao domingo ?e segunda ao jantar