Fugas - viagens

  • A estátua do poeta, no Chiado
    A estátua do poeta, no Chiado Miguel Manso
  • A estátua do poeta, no Chiado
    A estátua do poeta, no Chiado Miguel Manso
  • A Brasileira, Chiado
    A Brasileira, Chiado Miguel Manso
  • A casa onde nasceu o poeta
    A casa onde nasceu o poeta Miguel Manso
  • A esquina da Rua da Conceição com a Rua da Prata, onde Pessoa trabalhou e escreveu
    A esquina da Rua da Conceição com a Rua da Prata, onde Pessoa trabalhou e escreveu Miguel Manso
  • Restaurante Pessoa
    Restaurante Pessoa Miguel Manso
  • Marina Tavares Dias é olisipógrafa e estudou os percursos de Pessoa por Lisboa
    Marina Tavares Dias é olisipógrafa e estudou os percursos de Pessoa por Lisboa Miguel Manso
  • A estátua do poeta, no Chiado
    A estátua do poeta, no Chiado Miguel Manso

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A aldeia de Pessoa era o coração de Lisboa


Pessoa era o mais alto

Pelo caminho, podemos espiar até a Praça da Figueira. Pessoa cruzava-a continuamente, tanto por ter vivido nos "bairros orientais" (arredores da Almirante Reis) como por ter trabalhado em muitos escritórios da Baixa. Está a ver o Mercado da Ribeira? Nós estamos a vê-lo, ou pelo menos uma edificação muito semelhante, numa imagem do guia, a imperar nesta praça. "Era o mercado central de Lisboa e a mais importante construção de ferro e vidro da cidade", diz-nos a autora. "A sua demolição, em 1949, já depois da morte de Pessoa, foi um dos grandes atentados". Só para nós, Marina lê a Figueira por Pessoa, directamente de um trecho para esse Livro do Desassossego edificado na Baixa sob o heterónimo Bernardo Soares: "A praça da Figueira, bocejando venderes de várias cores, cobre-me esfreguesando-se o horizonte de ambulante." É no exacto momento em que um ambulante mais perto do delírio nos cruza o caminho, quase ao encontrão, vociferando dizeres que só ele perceberia. "Avanço lentamente, morto, e a minha visão já não é minha, já não é nada", prosseguiria Bernardo.

Das quase duas dezenas de direcções de escritórios em que Pessoa trabalhou, apontados pelo guia, Marina conduz-nos a um especial. Não pelo que se vê hoje mas pelo que se pode ver para sempre, mesmo que não exista. Os crentes compreenderão bem que se pare frente ao número 71 da Rua da Prata (gaveto com a Rua da Conceição). Aqui ficava a Ourivesaria Moitinho e, no primeiro andar, Pessoa trabalhou e aproveitou para dactilografar boa parte dos textos que compõem o Desassossego. O rés-do-chão é agora ocupado por lojas de souvenirs sem história. Mais tarde, haveremos de voltar, com uma curiosidade: terão, precisamente estas lojas, souvenirs pessoanos? Os empregados, porém, de ascendência indiana e arredores, não só desconhecem o português como o poeta lhes é completamente estrangeiro. Mas também não sucumbem: à palavrinha poet respondem com souvenirs de fado.

Por aqui, vai cantando o eléctrico 28, entre sopros e vibrações metálicas - o mesmo 28 que Pessoa tanto usaria, particularmente nos últimos 15 anos de vida de Campo de Ourique para voltar à sua "aldeia". Além da deambulação natural, Marina sugere-nos uma passagem pela Rua da Conceição (a dos retroseiros). "É interessante ver porque está mais ou menos como se conseguiria imaginar nessa altura." E isto "porque o comércio tradicional aqui implantado a seguir ao terramoto, que era o do retrós, ainda está bem representado". Admiramos a linhagem de velhas retrosarias ainda abertas, o que nos "dá um pouco a ideia do que era a rua quando Pessoa aqui passava". Por curiosidade: o grande amigo do poeta, Mário de Sá-Carneiro, nasceu num prédio nesta rua. Marina não perde a oportunidade e aponta para a placa evocativa, que guarda um daqueles mistérios únicos: a data de nascimento de Sá-Carneiro está errada. "Ele nasceu a 19 de Maio de 1890 e ali está escrito a 10 de Maio. Mas, enfim, antes uma placa, a única em Lisboa [dedicada a este poeta], que nenhuma."

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