Hopetown ou São Paulo?
Lençóis, a 417 quilómetros de Salvador, a capital do estado, é a porta de entrada na Chapada Diamantina - um parque com uma área de mais de 70 mil quilómetros quadrados. É aconselhável montar a partir desta cidade património nacional qualquer roteiro pelos inúmeros caminhos deste parque natural, um dos maiores do país. A cidade não tem mais de 10 mil habitantes, mas possui uma impressionante concentração de hotéis de qualidade, bons restaurantes e alguns bares de bom gosto.
É nesta cidade que se encontram os serviços e ofertas de guias para trekkings no Morro do Pai Inácio, visitas aos poços Encantado e Azul, às grutas da Lapa Doce e da Pratinha ou às inevitáveis cachoeiras, a mais célebre das quais é a da Fumaça e a mais recôndita a do Buracão, para lá desse fim do mundo que é Ibicoara (ver texto nas páginas seguintes). Entre Lençóis e Ibicoara existem outras cidades que viveram da procura de diamantes e que agora vivem do ecoturismo, o que não é um engodo político e populista, e que se tornou em algo valioso e incriticável para quem aqui vive. Para o secretário do Turismo do Governo estadual da Bahia, o ecoturismo foi um "avanço civilizatório", por ter "conduzido a administração municipal a considerar a preservação da natureza como um modelo de negócio". O negócio de que Domingos Leonel fala consiste em "preservar a natureza e os valores culturais".
As pequenas localidades como Andaraí, Mucugê ou Capão, com as suas reminiscências africanas, adormecem após o almoço, porque o sol assim as obriga, e sentam-se, à noite, em cadeiras de plástico à porta de casa. São cidades com poucos milhares de habitantes, algum comércio local, apenas o suficiente, um posto de correio, às vezes um banco, o que não é garantia de que se possa fazer algo rápido e de que uma caixa multibanco funcione, e uma praça à volta da qual tudo gira. O tempo escorre lentamente. As cidades vão curando as cicatrizes, longas mazelas de um longo intervalo entre os tempos do garimpo e os tempos mais aceitáveis de hoje, numa economia empurrada pela Petrobás para o estatuto de sexta economia mundial.
As primeiras jazidas de diamantes na Chapada foram descobertas na década de 40 do século XIX, o ecoturismo é uma certeza deste século. A gula chamou sertanejos e famílias do Recôncavo baiano; das cidades sobranceiras à Baía de Todos os Santos. Nessa altura, Igatu, a 114 quilómetros de Lençóis e a 800 de altitude, tinha cerca de 9 mil habitantes, hoje tem 400. A rápida ascensão e queda do negócio dos diamantes na Chapada Diamantina, bem como em outros pontos do Brasil, tiveram uma explicação tão prosaica quanto acidental. Porque foi por mero acidente que uma criança encontrou um diamante, em 1866, numa fazenda nas margens do rio Orange, em Hopetown, na colónia britânica do Cabo, na África do Sul, 22 anos depois de ter sido encontrado o primeiro diamante em Mucugê. Há nomes que são um presságio.
A rápida descoberta do valor daquela pedra, e a descoberta de muitas outras em outros locais do gigante da África austral, chamou aventureiros de todos os cantos e desviou o investimento no garimpo do Nordeste brasileiro. Os jornais do Cabo chamavam-lhe "diamants fever", lembra Martin Meredith em Diamonds, Gold and War - The Making of South África.