Fugas - viagens

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O trilho que abraça Gales

Quase me sinto inebriado perante a pungência da luz crepuscular que banha as casas de tonalidades fortes de Tenby, em galês Dinbych Y Pysgod, centro do comércio têxtil no século XV, exportando tecidos em troca de sal e vinho. Com o declínio do negócio, no século XVIII, Tenby teve a capacidade de se reinventar, como um lugar da moda à beira-mar, beneficiando da chegada do comboio, um século mais tarde, para se posicionar como uma das cidades mais procuradas do reino durante o Verão e uma das mais pacatas com a chegada do Inverno.

Para trás, ainda antes de me deixar encantar por Tenby, vão ficando aldeias e panorâmicas, gentes e expressões, nomes como Martin’s Haven, Dale, Milford Haven, a própria Pembroke, com o seu castelo onde nasceu Henry VII, o primeiro rei Tudor, mas também, muito mais para lá, um outro castelo, em Manorbier, olhando as ruas que quase se abraçam, sobranceiras a praias de areias finas, ainda mais sossegadas do que as vizinhas Freshwater West, mais de três quilómetros de praias douradas e de tantas dunas, capital do surf em Gales, perigosa para nadar e sedutora para cenário de filmagens.

Depois de Tenby, sucedem-se Laugharne, onde se isolou Dylan Thomas, numa casa debruçada sobre o estuário do rio Corran, e facilmente se chega à Península de Gower, à quietude da afamada Rhossili Beach, votada não raras vezes como uma das melhores da Europa e do mundo.

A pé, sem grande esforço alcanço Mumbles, um dos lugares eleitos (pelo menos para beber) de Dylan Thomas, também devido à sua proximidade com Swansea, a cidade onde o escritor nasceu e com frequência associada a um cinzentismo do qual tarda em libertar-se, ao contrário de Mumbles, que goza de uma certa reputação por ser o local onde algumas estrelas da música e do cinema mandaram erguer as suas casas sumptuosas, algumas delas orçadas em muitos milhões de euros.

Mumbles mantém uma boa parte do charme do passado, como se vivesse ainda no tempo em que era, há já 200 anos, o retiro de Verão perfeito dos habitantes de Swansea — ligadas no início por uma carruagem puxada por cavalos, projectada na sua génese para o transporte de carvão, não tardaram a estar mais próximas com a chegada do comboio, naquele que foi o primeiro serviço ferroviário de passageiros em todo o mundo.

0 caminho prossegue até Port Talbot, fitando já Cardiff no horizonte, com a sua baía de cara lavada, uma exposição permanente da moderna nação galesa, tão em contraste com a nação mineira do início do século passado, quando exportava mais de 13 milhões de toneladas de carvão a partir das docas da capital.

Agora — e desde 1987, ano em que se iniciaram as obras de renovação da marina —, um conjunto de edifícios modernos decora a Cardiff Bay, com os seus restaurantes para se ver e ser visto, ao lado do Pierhead, uma das poucas reminiscências do período vitoriano, com o seu tijolo vermelho, vulgarmente alcunhado de “Big Ben de Gales” e construído com dinheiros dos Bute, uma rica família de aristocratas escoceses que se radicou em Cardiff na década de 60 do século XVIII.

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