Jacob Jan Boerma é um tipo comum. Divertido e sorridente, mas também atento e curioso a tudo o que se passa à sua volta enquanto circula pela cozinha com aquele ar seguro de quem sente que está tudo sob controlo. Não há agitação ou ponta de stress. Observa e confirma, sublinhando aqui e ali com monossílabos os gestos de aprovação que intercala com brindes de boas-vindas levantando a flûte de champanhe.
Não fosse o olhar mais grave e felino de Ricardo Costa e dificilmente se perceberia estarmos no centro operacional de um dos eventos mais importantes e de maior responsabilidade no calendário gastronómico nacional. A etapa da Rota das Estrelas do The Yeatman, em Gaia, desperta a atenção dos especialistas e junta sempre nomes maiores da cozinha internacional às estrelas que por cá oficiam.
E este ano não foi excepção. Com três estrelas Michelin no seu restaurante De Leest, no centro da Holanda, Boerma era uma espécie de cabeça de cartaz num desfile de técnica e sabores que contou também com os duas estrelas algarvios, Dieter Koschina (Vila Joya) e Hans Neuner (Ocean), os estrelados Pedro Lemos (Porto), João Rodrigues (Feitoria, Lisboa), Joachim Koerper (Eleven, Lisboa) e o anfitrião Ricardo Costa, e ainda Ljubomir Snatisic, do lisboeta 100 Maneiras.
Era, portanto, de calma e silêncio o ambiente que dominava a cozinha no jantar de encerramento do evento. Que se destacava ainda mais por corresponder a uma dinâmica e azáfama permanentes, com taças e tabuleiros a circular de mão em mão, ingredientes que se adicionavam em pratos que se iam compondo até chegarem às mãos do chef para o retoque e aprovação final. Go, go!
Uma harmonia ainda mais perfeita quando notamos que envolve cozinhados e texturas diversas, diferentes funções, uma multiplicidade de mãos e até a comunicação multilingue, já que ao português e flamengo originais das duas equipas se juntava o inglês em que comunicavam entre si.
E foi na língua de Sua Majestade que o chef holandês mostrou a sua aprovação e admiração pelos peixes e mariscos do mar português, como os lagostins e carabineiros que usou. “De uma frescura e sabor incríveis. Fantásticos!”, sentenciou. A par dos peixes, que não terão constituído propriamente novidade, Jacob Boerma fazia questão de mostrar a agradável surpresa que encontrou nos vinhos portugueses que teve oportunidade de provar.
Chamou mesmo a atenção de jornalistas e alguns compatriotas para a forma excitante como casavam com os seus pratos. Mérito, mais uma vez, para a competência da directora de vinhos do Yeatman, Beatriz Machado, que assim se confirma como grande embaixadora da produção nacional.
A par do Soalheiro Primeiras Vinhas 2014, ao qual o cozinheiro estava literalmente rendido, também outro branco, o Niepoort Coche 2013, cativou a sua atenção. Nos tintos, fabuloso o Duas Quintas Reserva Especial 1995, sendo que também o Herdade do Mouchão 2009 e o Porto Vintage 2001 da Quinta das Vargellas foram muito apreciados.
Momento alto foi o prato que Boerma concebeu para destacar a frescura e sabor dos “carabineiros portugueses”. Um tom kha kai à sua maneira, ou seja, uma versão fresca e aromática à base de vegetais da tradicional sopa de galinha e coco tailandesa. Foi com grande entusiasmo que falou deste cozinhado típico daquele país — “vai ser a próxima coqueluche da cozinha” — depois do festival de cozinha de rua de dez dias em que participou recentemente.