É pelos recintos de festas e romarias que a sardinha assume o estatuto de rainha. Assada nas brasas atiçadas pela brisa e a derramar gordura no pão, dá o sabor e tempero aos festejos populares. Desde sempre que a abertura da temporada acontece com as festas do Senhor de Matosinhos, nos primeiros dias de Junho, com a tradição a impor que aí se fossem provar as primeiras. Este ano, no entanto, tem sido com recurso a "espanholas" e "congeladas" que a festa se vai fazendo. Há sardinhas, é certo. Mas não são bem a mesma coisa.
Aponta-se, agora, para o São João, mas há também quem já alvitre que nem aí estarão ainda no seu melhor. "Com este tempo baralhado como anda, boas, boas, só lá para o São Pedro", ouvimos por estes dias sentenciar entre pescadores da comunidade de Caxinas, onde garantem que é mesmo em finais de Junho que estão mais gordas e saborosas. Pelo São Pedro, tal como sempre acontece para as festas da Afurada, em Gaia, na foz do Douro, e da Póvoa de Varzim, onde fazem o orgulho das respectivas comunidades piscatórias. Na Póvoa, é até tradição dos bairros Norte e Sul - habitados por pescadores - de as assar na rua e oferecer aos passantes na noite de festa. E é mesmo de aproveitar. Não pela borla, mas porque a experiência diz que são sempre das melhores da temporada.
Popular e democrática como nenhum outro peixe, a sardinha saboreia-se em todo o tipo de restaurantes, sem atender a categorias ou classes. Têm é que ser frescas e gordas e bem assadas, que é como quem diz a largar a gordura e sem se deixarem queimar. Basta uma fonte de calor para as cozinhar na perfeição, pelo que é muitas vezes em modestos restaurantes que melhor as saboreamos.
Desde sempre que, na região do Porto, sardinhas rimam com Matosinhos e as centenas de restaurantes que povoam as ruas mais chegadas à lota e zona portuária. Por esta época, é ver os assadores colocados ao longo dos passeios e pode-se mesmo escolher olhando para o produto. Há casas para todos os gostos e estilos e até algumas onde conseguem servir sardinhas ao longo de todo o ano. E não vêm de fora, asseguram. São congeladas em água do mar e, fora de época e para matar saudades, cumprem muito bem a função. µ±O conselho da Fugas vai, no entanto, um pouco mais para sul, para o Restaurante Moçambique, na rua Meneres, nº 223, uma perpendicular ao mar quase na esquina com Brito Capelo. Casa de estilo familiar, com preços comedidos, onde a melhor garantia é o facto de a oferta ser praticamente limitada aos peixes frescos do dia. Sardinhas, tal com o resto, só mesmo vindas da lota e quando a qualidade é a devida.
Os peixes são amanhados na chapa do grande fogão colocado no centro da cozinha em volta do qual parece haver em permanência uma espécie de reunião de família. Tudo detrás do balcão envidraçado onde repousa a oferta do dia e ali mesmo à vista do cliente.
Para acompanhar as sardinhas, em doses generosas, há pimento assado e batatas cozidas, daquelas que se desfazem na boca e cujo sabor logo denuncia as origens rurais. Há também uma broa de mistura (milho e centeio), de estilo rústico, cujo senão é o facto de sermos sempre tentados a comer mais do que a conta.