No que toca a presuntos, Guijuelo brilha não só pela quantidade, como pela qualidade, já que é a casa do afamado Joselito, uma marca que conseguiu juntar duas palavras à partida tão distantes como luxo e enchidos. Se bem que Joselito dá o nome também a chouriços, salsichões e a toda uma variedade de enchidos, a estrela da companhia é, sem dúvida, o presunto. Um produto que é tratado com grande reverência desde que o bácoro nasce ao som de música clássica até ao fim do repouso mínimo de sete anos de cada peça de carne. Entre o princípio e o fim da vida, o porco é alimentado apenas com bolotas e passeia ao ar livre para se libertar do stress que, como é sabido, no final lhe dará um mau sabor.
Estas e outras pequenas curiosidades são reveladas ao longo do caminho até ao norte do país para cruzar a fronteira com Espanha. Ao todo serão seis horas de viagem e três chefes de renome que nos acompanham. Luís Baena, Vincent Farges e Pedro Lemos são os companheiros ideais de uma viagem gastronómica por alguns dos produtos gourmet de Castela e Leão que terá como ponto alto, nada mais, nada menos do que um almoço na casa do Joselito. Com um preço de cerca de três mil euros por peça (com uma cura de sete anos), um presunto Joselito é um prazer reservado a poucos.
O mítico chefe catalão Ferran Adrià, Shakira ou a Rainha de Inglaterra apreciam-no regularmente e ajudaram a celebrizá-lo (Lula da Silva fez questão de pedir um Joselito quando veio a Coimbra receber o doutoramento honoris causa). Daí que ao sermos recebidos na casa de José Gómez, o proprietário desta empresa familiar com mais de um século de existência, com um Joselito de nove anos reservado apenas a convidados, não nos sentimos menos do que privilegiados.
Uma brasa que nunca se apaga
Com a carne já dentro do forno de lenha, José Gómez é um hábil anfitrião que corta presunto (claro), mas também salsichão e paio enquanto o champanhe é servido em paralelo. É o formato ham and champ que não surpreende quando nos lembramos que entre as marcas de luxo de que a Joselito é parceira está a Don Perignon. Ainda assim, a garrafeira de José Gómez tirou o fôlego aos apreciadores de vinho presentes.
As presenças mais apreciadas à mesa foram os tintos que desfilaram e fizeram perder as horas encabeçados por dois Vega Sicilia: um Valbuena 2001 (mil euros em média por garrafa) e um Unico 1994 que, a cerca de 3500 euros de preço base, não podia ser outra coisa que não o nome com que se apresenta.
A sobremesa foi uma visita à fábrica do Joselito, localizada a dois passos da casa de José Gómez. Do andar de negócios descemos equipados com batas para o nível subterrâneo onde os presuntos estão pendurados no tecto às centenas como morcegos numa gruta. Vários deles já com um destino certo, apesar dos anos que ainda os separam do proprietário. Nenhuma das peças que aqui vemos será vendida cortada. A versão fatiada do Joselito abrange apenas as patas dianteiras do animal, consideradas de menor qualidade.
Novamente confrontados com a reverência dada ao produto, a pergunta torna-se inevitável: Afinal, o que é que torna este presunto tão especial (uma colecção de prémios internacionais e alguns críticos rendidos descrevem-no com o título de "o melhor presunto do mundo"): "É um presunto muito baixo em sal, muito doce e que tem uma cor rosa púrpura com muita gordura marmoreada, um aroma intenso e muito impacto na boca", descreve José Gómez.