Fugas - restaurantes e bares

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De copo em copo, na cidade da “mistura”

Por Pedro Rios

Há dez anos ninguém preveria o que aconteceu à Baixa do Porto. O centro tornou-se o coração da noite da cidade, com novos bares a abrirem todos os meses. Um roteiro de sábado à noite entre muitos outros possíveis.

22h30
O céu ameaça chover e o termómetro marca oito graus, mas oito graus deste Inverno húmido, oito graus que enregelam e, alegadamente, fecham as pessoas em casa. Não é, porém, isso que indicia a procissão de carros estacionados na Rua do Almada, uma das artérias que apontam ao coração da noite portuense, na Baixa da cidade.

Há menos de dez anos, quando o Porto estava ainda longe de sonhar tornar-se melhor destino europeu do ano, esta rua era conhecida pelas lojas de ferragens e peças para máquinas. As lojas ainda lá estão, mas ganharam a companhia de bares. Um deles acabou de se juntar à movida que poucos imaginariam há dez anos. No Almada Minha, o primeiro cookie bar do Porto, fazem-se combinações de bolachas com bebidas alcoólicas - tequila, gin, vodka, vinho, tudo pode funcionar com a bolachinha certa.

23h05
Sem fome para bolachas, seguimos rumo ao coração da movida. É, porém, ainda cedo para vê-lo a bombear. No Alma, um dos vários bares que abriram na Rua da Galeria de Paris nos últimos anos, há fogo na rua e contaminações jazz nas colunas a tentar contrariar o frio. Mais tarde, há-de se dançar lá dentro enquanto se bebericam mojitos de pêssego e gengibre, mas, para já, tudo está calmo.
Dirigimo-nos ao vizinho Era uma Vez em Paris. Os espelhos na parede e candeeiros mortiços decoram este enfumarado bar a meia-luz. Guitarras rock estrepitam nas colunas, mas o povo ainda não dança. Confirmamos: a noite acorda lentamente no Porto.

23h45

Não fica longe (uma das vantagens da noite na Baixa do Porto: nada fica longe) da Galeria de Paris. Chegamos à Travessa de Cedofeita e um quadro de ardósia na montra do Canhoto promete-nos o "rock do peso" dos portugueses Asimov e "Cinho e Satã nos pratos". A decoração da montra desta antiga loja de artigos usados, transformada em bar, é bizarra: há uma guitarra, um disco em vinil dos Asimov e velhos teclados de computador. 

Espreitamos o vizinho Espaço 77. Há dois anos, foi notícia que o 77 ostentava o recorde nacional de venda de "minis": vendeu 378.230 garrafas de cerveja de 20 centilitros só em 2011. É provável que assim se mantenha, mas só mais tarde poderemos assistir ao corrupio de cerveja e panikes tradicional deste café. 

Caminhamos 260 metros para a Rua da Conceição. Na esquina com o renovado Largo de Mompilher, o Café Candelabro, uma antiga livraria alfarrabista, entrega-se à boémia no lusco-fusco. Cá fora, Emile, holandês de 24 anos, exibe orgulhosamente uma taça, destinada, diz-nos, ao maior bebedor do grupo de 14 com que viajou para o Porto. Viajaram com um objectivo simples: "beber o fim-de-semana inteiro, festejar". E gostam da experiência, mesmo das "subidas e descidas" do terreno, muito diferente da plana Amesterdão.

0h10

Nas ruas já se anuncia a confusão. Ei-los que saem das hamburguerias, uma moda recente na cidade; de restaurantes bem portugueses ou de outras latitudes (há turcos, japoneses, um mexicano...); dos clássicos das francesinhas (do Aviz ao Santiago). Tal como os bares, boa parte destes restaurantes também não existia há dez anos.

As luzes de uma bola multicolorida a rodopiar sobre si própria convidam-nos a entrar no Baixaria, na Rua do Almada. O R&B é o prato do dia. Nas mesas, iluminadas por candeeiros que são também vasos com plantas, conversa-se e bebe-se.

0h20

O frio do exterior não entra nesta sala. Estamos no quarto andar do prédio de 1939 onde mora também a Garagem Passos Manuel. Poucos frequentadores da noite do Porto não saberão do que estamos a falar: em 2001, Daniel Pires anteviu o que a Baixa da cidade podia ser e fundou o Maus Hábitos.

Um aquecedor dá calor à sala maior do espaço, voltada para o Coliseu do Porto - conversa-se, bebe-se vinho e ouve-se música. Do outro lado deste complexo de salas (há uma galeria, espaços para residências artísticas e uma oficina), os Las Aspiradoras, vindos de Toledo, fazem calor por outras vias: guitarras rock'n'roll.

"Estivemos ontem em Santo Tirso e chegámos de madrugada ao Porto. É muito bom, as pessoas são muito acolhedoras", diz-nos o vocalista e guitarrista Diego Pérez (casaco de couro, sapatos de bico), encantado com a primeira visita ao Porto.

Só Daniel Pires votou três vezes para que o seu Porto conquistasse o título de melhor destino europeu do ano. "Só nos serve de aviso para uma coisa muito importante: há muita gente atenta [ao Porto]. E não estamos preparados", sublinha. "Que o Porto é uma cidade fantástica todos nós sabemos. É preciso estar à altura e começar a criar conteúdos interessantes."

Daniel tem feito por isso. Isto não é só um bar: é um laboratório de experiências artísticas, um restaurante vegetariano (aos almoços), uma sala de espectáculos (por lá já passaram meio país musical e vários nomes internacionais) e... um bar.

0h55

"Sempre tivemos muitos [clientes] estrangeiros", nomeadamente galegos e franceses", diz Daniel. Sonja Lazic é de paragens mais longínquas. Vem de Zagreb, na Croácia, e está no Porto, ao abrigo do programa Erasmus, para estudar francês e espanhol. 

Ouviu "muitas histórias" sobre o Porto, todas promissoras. "As pessoas diziam: ‘É a melhor cidade de sempre'. Queria muito vir aqui", confessa. Sonja chegou há duas semanas e vai ficar por mais cinco meses na cidade que bateu a sua na votação para melhor destino europeu do ano (o Porto conseguiu 14,8% dos votos, Zagreb ficou-se pelos 10,2%). 

"Apaixonei-me pela cidade", conta. Apaixonou-se também pela noite mais alternativa. Já viu um dos seus heróis, Scott Kelly, a tocar no Passos Manuel, vizinho do Maus Hábitos. "Temos algo semelhante em Zagreb, um velho cinema que é uma sala de concertos."

1h26

Descemos a Rua de Passos Manuel, atravessamos a Avenida dos Aliados e eis-nos quase que noutra cidade do que aquela que existia há pouco mais de uma hora. As ruas encheram-se. Os vendedores ambulantes de bebidas tentam a sua sorte. O povo amontoa-se na Praça de D. Filipa de Lencastre e nas ruas de Cândido dos Reis e da Galeria de Paris. 

Encontramos alguma calma no La Bohème, bar forrado a madeira e repleto de garrafas de vinho. Na parede, uma citação do brasileiro Carlos Arruda, consultor especialista na matéria: "O vinho é o melhor lugar para se encontrar com os amigos." Faz sentido, portanto, que a carta de vinhos do La Bohème seja longa. Os copos mais baratos custam 2,50 euros e podem acompanhar uma refeição de tapas - do Camembert panado com doce de tomate à proverbial punheta de bacalhau.

Chove, mas nem por isso a Rua da Galeria de Paris se esvazia. Renata Szlachta, brasileira de 26 anos a viver em Amesterdão, gosta do "lado informal" da noite da baixa portuense. "Em Amesterdão não há disto de ficar na rua. É muito frio". É a terceira vez que está no Porto, onde tem vários amigos.

2h50

"Estivemos ali na outra rua a beber shots e a divertir-nos. É muito melhor do que a noite de Oslo", garante Juni Rydel, norueguesa de 25 anos, numa mesa do Plano B, na Rua de Cândido dos Reis. "Adoramos Portugal. Os rapazes são muito bonitos", afirma Juni. "E as raparigas também", acrescenta a amiga Denise Bricen, de 19 anos. Asseguram que vão voltar.

Quando o Plano B abriu, em Dezembro de 2006, os bares na Baixa contavam-se pelos dedos de uma mão (ou quase). Nesses tempos de "festas privadas" em que só se entrava com palavras-passe, a clientela do bar era portuense. Depois, tornou-se portuguesa. Hoje, "há noites em que os estrangeiros chegam a ser 30%" do povo do Plano B, diz Filipe Teixeira, um dos responsáveis deste bar, uma das opções da Baixa para acabar a noite a dançar. O Gare, junto à estação ferroviária de São Bento, também só fecha às 6h.

O ano passado foi o mais "concorrido" de sempre no que toca a visitas de estrangeiros e 2014 promete ultrapassá-lo, acredita Filipe.

As estrangeiras Denise e Juni gostam da "mistura" que encontram nas ruas da Baixa portuense à noite. "Posso estar neste bar enquanto estás noutro bar e encontramo-nos na rua", explica Juni. "A vida nocturna é mais intensa." E mais longa: "A esta hora, em Oslo, estaria nas últimas bebidas.

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