Nuno Mendes fala com leves hesitações, como se procurasse a palavra mais correcta (às vezes encontra-a em inglês). Tem um sorriso simpático, quase tímido, puxa frequentemente para trás o cabelo que lhe cai para cima dos olhos. Mas esta aparente timidez esconde uma determinação: este é um homem que sabe o que quer fazer, e que o faz mesmo quando a sua escolha é pouco convencional e parece a menos óbvia.
Para nos situarmos, é preciso fazer um pequeno resumo do percurso até aqui do chef português actualmente à frente do mais falado (e cobiçado) restaurante de Londres, o Chiltern Firehouse, projecto do empresário André Balazs, e local preferido das estrelas de cinema e demais celebridades que passam pela capital britânica.
Vamos andar para trás um passo de cada vez. Antes da aventura do Chiltern, Nuno Mendes, 41 anos, tinha o Viajante, um projecto muito mais pequeno mas igualmente de grande sucesso, no qual fazia uma cozinha com marcas portuguesas cruzadas com as muitas viagens que fez pelo mundo. Com o Viajante, que abriu em 2010, conquistou uma estrela Michelin (logo no primeiro ano), e o 59.º lugar na lista dos 50 Melhores Restaurantes do Mundo (que na verdade são 100), organizada pela revista britânica Restaurant.
Mas se o Viajante, situado em East London, a sua zona preferida na cidade, era um espaço pessoal, onde havia uma relação próxima com os clientes, o projecto anterior tinha sido o embrião de tudo isso. Chamava-se Loft e funcionava na própria casa de Nuno. Parecia uma ideia arriscada, mas foi um enorme sucesso. Mais arriscado só a opção que tinha feito antes dessa, ao chegar a Londres: quando teve a hipótese de escolher entre um restaurante em Trafalgar Square e um gastropub em East London, num antigo pub numa zona mal afamada, escolheu o último. Chamava-se Bacchus — e foi aí que os londrinos começaram a reparar que havia alguma coisa de especial neste português que antes passara 16 anos nos Estados Unidos, onde estudou na California Culinary Academy, em São Francisco.
Em Lisboa — onde esteve recentemente a convite das Edições do Gosto para presidir ao júri do Concurso Chefe Cozinheiro do Ano — falou deste percurso para uma plateia cheia de aspirantes a cozinheiros na Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa. Dois dias depois, encontrámo-lo na FIL, onde estava a decorrer o concurso, e começámos a conversa a partir do fenómeno do Chiltern Firehouse.
“Passei 16 anos nos Estados Unidos e como no Viajante fazia uma cozinha mais baseada em ideias portuguesas, nunca tinha tido a oportunidade de expressar esses 16 anos de experiências. Aliciou-me a ideia de um projecto que manifestasse essas minhas vivências”, conta. “Depois, o espaço [um antigo quartel de bombeiros] é incrível e o André Balazs é uma pessoa com projectos muito interessantes [que incluem o Hotel Mercer em Nova Iorque, o Standart em Los Angeles, Nova Iorque e Miami, e o célebre Chateau Marmont em Hollywood].”
Apesar disso, não foi uma decisão fácil, porque aceitar o desafio do Chiltern Firehouse implicou fechar o Viajante. “Estava muito nervoso, especialmente por anunciar que o Viajante ia fechar. As pessoas perguntavam porque é que eu ia deixar um sítio onde fazia uma cozinha muito criativa portuguesa por um projecto assim. Foi muito arriscado para mim.”