Fugas - restaurantes e bares

Nelson Garrido

O pão nosso de cada refeição

Por José Augusto Moreira

Sem trabalho não há pão, sem pão não há vida. Faz parte do prazer gastronómico e é tão natural a sua presença à mesa que muitas vezes nem é notado. É o oxigénio da refeição, principalmente quando se trata de gastronomia regional.

Está sempre presente, é indissociável do prazer e exigência gastronómica mas raramente é notado. Não porque se menorize ou deprecie o pão à mesa, mas antes porque a sua presença é tão natural e indispensável que faz parte da natureza das coisas. Tal como o ar que respiramos, é como uma espécie de oxigénio da refeição, principalmente quando falamos de gastronomia regional. Pão e vinho sobre a mesa, que o resto é que pode variar.

À parte da sua essencialidade para os prazeres da mesa, o pão teve sempre também um papel fundamental na cultura e alimentação dos povos ocidentais. E até na economia, como ficou largamente ilustrado com a carcaça, uma invenção portuguesa do tempo de Salazar.

Pela sua riqueza em carboidratos, é uma importante fonte de energia para o organismo humano. Contém também fibras, vitaminas e minerais que são fundamentais ao equilíbrio alimentar. Daí que tivesse saído furada a antiga estratégia de alimentar os presos a pão e águas como forma de castigo. Em vez de morrerem, os presidiários permaneciam saúdaveis.

Base da alimentação durante longos tempos, principalmente dos mais desfavorecidos, a sua essencialidade até muitas vezes representada como símbolo de vida e factor de coesão social: sem trabalho não há pão, sem pão não há vida!

No filme O Pão, Manoel de Oliveira põe em paralelo a celebração de um casamento e a produção do pão para enfatizar a sua importância como pilares da organização social e da vida em colectividade. Por um lado, a união entre homem e mulher; por outro, a sementeira e colheita do trigo e a posterior produção industrial do pão, essenciais à subsistência e continuidade da vida.

O filme foi realizado em 1959, por encomenda da Federação dos Industriais de Moagem, e Oliveira confessaria mais tarde, em entrevista a João Bérnard da Costa, que procurou mostrar a ideia de que o pão é como a corrente de um rio que passa por vários lugares, por diferentes mãos e diferentes tipos de pessoas. “Servi-me do pão para enfrentar muitos aspectos da vida portuguesa. Procurei sobretudo mostrar o papel do homem em cada etapa do fabrico do pão e a comunicação que se instaura assim entre homens muito distantes no seu espaço através de um único elemento: o grão de trigo.”

E embora o trigo seja normalmente usado como símbolo do pão no nosso país — é, de facto, o mais utilizado no fabrico de pão —, têm também forte tradição os pães de milho, de centeio e os de trigo com cevada. A distinção é sobretudo regional e decorria historicamente dos cereais que eram predominantes em cada zona, em função da adaptação da sua cultura às condições naturais: o centeio nas zonas de montanha de Trás-os-Montes e serra da Estrela; o milho no Minho e grande parte do norte do Douro; o trigo no resto do país; e a mistura de cereais nas zonas de transição do Centro e Beiras.

Com a industrialização da produção do pão, o comércio e a importação de farinhas, os diferentes tipos de pão encontram-se hoje disseminados por todo o território, principalmente nos centros urbanos. Daí que Mouette Barbof, na sua obra essencial A Tradição do Pão em Portugal, editada pelo Clube do Coleccionador dos Correios, o tenha dividido em dois grandes tipos: o pão das cidades e os pães regionais.

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