Mandou desmantelá-lo na íntegra e até contratou para o efeito uma empresa de demolições de Berlim Ocidental, que completou o trabalho em finais de 1991. Devem ter armazenado boa parte desse entulho, porque ainda hoje há fragmentos "autênticos" do Muro à venda na maior parte das lojas de "souvenirs" da cidade mas isso é outra história, ou melhor, outro corolário da mesma história de ausência. Em qualquer caso, na altura das demolições quase não se registaram protestos, nem a Ocidente, nem a Oriente. À medida, porém, que o tempo foi passando foi também crescendo a consciência do valor histórico e simbólico do Muro, o que naturalmente fez disparar a sua cotação turística.
O Muro, na realidade, foi sempre uma atracção turística. Era uma aberração, sem dúvida, mas durante os mais de 28 anos em que se manteve de pé ofereceu aos turistas uma experiência tangível do horror incluindo seguir tentativas de fuga, ao vivo e em directo, do outro lado do passeio em Bernauer Strass, onde agora está montado um "complexo memorial". Depois da queda, a maior do Muro, sobretudo os pontos mais negros da sua história no centro da cidade deram lugar a um intenso frenesim imobiliário. Esta vertigem de desenvolvimento levou à demolição, ou em alternativa à integração dos seus bastiões em novos equipamentos. É o caso dos fragmentos do Muro que decoram o "lobby" do novo Ministério do Ambiente (que, por sua vez se instalou no Ministério Prussiano da Agricultura), mas também da torre de observação fronteiriça em Erna-Berger Strasse, frente à Potsdamer Platz, deslocada alguns metros depois da Reunificação para dar lugar a novos arranha-céus.
Chegou ao ponto em que muitos visitantes e mesmo os habitantes dos escalões mais jovens têm dificuldade em perceber o traçado da antiga fronteira fortificada. É, na verdade, a pergunta mais frequente colocada pelos turistas: e então onde é que era o Muro? A resposta está, como sempre, na net (www.berlin.de/mauer), mas também nas ruas, assumindo a forma de uma dupla tira de godos, pontuada por placas de metal com a inscrição "Berliner Mauer 1961-1989", que agora serpenteia pelo pavimento de passeios e ruas do centro da cidade.
A operação de anamnese passa também por um circuito de contextualização, constituído por 29 conjuntos de painéis de informação com fotografias históricas e explicações sobre as principais estações do antigo traçado do Muro. Um terceiro expediente são sete criações artísticas colocadas em igual número de antigos postos de cruzamento de fronteira. Destacam-se as "Ohne Titel" (caixas de luzes) de Frank Thiel (1998), dois retratos gigantes, um de um soldado americano, outro de um russo, colados um contra o outro, oito metros acima do trânsito, sobre Checkpoint Charlie. O americano olha para Berlim Este, o russo para Oeste, sendo que os dois retratos foram tirados em 1994, antes da retirada definitiva dos Aliados.
Um punhado de obras de arte, um conjunto de painéis informativos, mais uma tira de godos são boas soluções para manter as memórias em dia, mas não são o Muro verdadeiro. Resta, em pleno centro da cidade, um único troço contínuo de muro em pé, que se estende por cerca de 160 metros de Niederkirchner Strasse, a dois passos de Checkpoint Charlie. Este sim, é o artigo genuíno, ainda mais inquietante e sórdido pelo estado de iminente derrocada em que se encontra. Nada em Berlim é tão Cortina de Ferro, ou capaz de traduzir a experiência de 28 anos de muro traumático, quanto esta tira de betão em ruínas. Vai certamente deixar de ser tão contundente e bem mais bonito quando for intervencionado e passar a estar vedado, como parte integrante de um novo núcleo monumental, centrado no vizinho antigo quartel-general da Gestapo.