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Muro de Berlim

Muro de Berlim Paulo Pimenta

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Berlim - O muro real e o virtual

Intervenções artísticas

Em 1990, já o Muro caminhava para o desmantelamento, um grupo de artistas designado Kani Alavi descobriu uma parcela de 1,3 quilómetros que tinha permanecido intacta. Assim nasceu a East Side Gallery, conhecida como a maior galeria de arte a céu aberto do mundo. Antes disso, na verdade praticamente desde a construção, as paredes do Muro serviram para exprimir a sua própria condenação. Começou com a escrita de epigramas de natureza política, nos anos 60, a que depois se vieram acrescentar posters, estandartes e toda a gama de novos meios de protesto visual, típicos do final dessa década.

A escrita de "graffiti", originária de Nova Iorque, foi introduzida na primeira metade dos anos 80, sobretudo a partir de Kreuzberg e da corrente neo-expressionista dos "Neue Wilden" (novos selvagens), que nasceu nesse bairro degradado, então colonizado por estudantes, emigrantes e artistas. Na quarta e última geração de blocos de betão do Muro (1983), mais largos e de superfície mais suave, "graffiters" e artistas de rua reconheceram a tela ideal, levando-os a arriscar atravessar ilegalmente a fronteira para intervirem no Muro, sempre colocado três ou quatro metros mais à frente, no interior da RDA. Houve algumas detenções, mas sem grandes consequências, e assim os principais pólos turísticos da cidade, como a Porta de Brandemburgo e a Potsdamer Platz, rapidamente foram decorados com peças de grande escala (e impacto). O fenómeno envolveu não apenas artistas locais, mas muitos estrangeiros e o nova-iorquino Keith Haring foi mesmo chamado a pintar mais de 100 metros de Muro (1986), nas imediações de Checkpoint Charlie.

Era uma fabulosa colecção de arte de rua, que naturalmente foi riscada do mapa quando o Muro foi demolido. Esse vazio acabou por ser de algum modo compensado pela East Side Gallery, um troço esquecido que veio a ser intervencionado por um grupo de artistas, boa parte originários do núcleo original de Kreuzberg. Corre ao longo da Muhlenstrasse, entre a ponte de Oberbaum e a estação ferroviária de Ost, e tem a particularidade de ser a única parcela substancial de muro pintada na sua face oriental, uma vez que as restrições de circulação entre os dois lados da fronteira na altura já tinham sido levantadas. O projecto envolveu 118 artistas, que assinaram igual número de peças, algumas das quais se tornaram em emblemas instantâneos de Berlim, como a imagem do Trabant que rompe o muro (Birgit Kinder), o beijo dos líderes Erich Honeker e Leonid Brezhnev (Dmitri Vrubel), ou os gigantones de Thierry Noir.

Uma série de factores, que vão da poluição ao vandalismo, convergiram para a degradação da East Side Gallery, até que a edilidade lançou um ambicioso projecto de recuperação, aproveitando este ano de comemorações. O restauro, que será inaugurado em Novembro, envolveu polir o betão, desenferrujar as vigas e apagar todos os "graffiti", antes de estes voltarem a ser pintados pelos seus autores. O projecto é coordenado por Thierry Noir, que assegurou o concurso da maior parte dos artistas envolvidos (84), contra a remuneração de 3000€. Alguns, no entanto, acharam essa quantia um insulto, enquanto outros aceitaram intervir, mas não repetir as imagens que criaram há vinte anos.

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