Fugas - Viagens

Luís Maio

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Chatuchak - O inferno mais delicioso da Tailândia

Entre pitons e transexuais

Os tailandeses comem quase tudo o que mexe, mas também adoram ter animais de estimação e nenhum lugar oferece tanta variedade de bichos à venda como Chatuchak. A maior parte são os animais domésticos do costume, cães e gatos às centenas, muitos de raça, a que se acrescentam peixes aos milhares das mais variadas espécies. Ratos, tartarugas, esquilos e papagaios são também populares, mas pelo meio há vitrinas preenchidas por bichos menos amigáveis como tarântulas, serpentes e pitons.

Esta secção é responsável pela má publicidade que o mercado de Banguecoque tem motivado na imprensa internacional, derivada das denúncias de tráfico ilegal de espécies em perigo. Esse comércio, no entanto, desapareceu (pelo menos da vista) no último par de anos e a secção de animais domésticos de Chatuchak é hoje um lugar mágico onde crianças tailandesas de todas as idades se apaixonam por bichos a toda a hora.

Pode não haver logística para levar um cachorro para casa (embora se vejam muitos ocidentais de roda dos bichos de raça), nem orçamento para comprar relíquias e outras peças de colecção. Mas com um sortido virtualmente infindável de objectos de desejo a preços ultra-convidativos - uma t-shirt comprada no mercado de Patpong pode aqui custar sete vezes -, é quase impossível sair de Chatuchak de mãos a abanar. Os números falam por si e, apesar dos preços de saldo, o volume de negócios por fim-de-semana ronda os 120 milhões de bahts, ou seja, cerca de 2,50 milhões de euros. Neste paraíso de compras, o ocidental é mais susceptível de passar ao consumo frenético, motivado pela sensação eufórica de descobrir e conquistar, não de estar a gastar dinheiro. Sairá com mais sacos que mãos e a consciência pesada, não tanto pelo que comprou, mas por aquilo que não chegou a meter ao saco.

Quase tudo o que se acaba por levar traz a marca de um certo artifício pop e exótico. É uma conjugação de simpático, bonito e fofo, uma mistura peculiar de Japão e Disneylândia, que é completamente thai. Domina a mais vasta gama de artigos, desde a extensão da tradicional escultura de frutas ao negócio dos sabonetes até às imagens de bonecos sorridentes estampadas em doces e coberturas de telemóveis. Em Chatuchak até o artesanato tradicional virou pop e as estátuas de anjos e deuses partilham agora os mesmos olhos gigantes, a ocupar meia cara, comuns nos mangas tailandeses.

A assimilação thai da cultura global encontra ainda farta expressão nos diversos espectáculos, que se multiplicam ao fim da tarde nas principais ruas do mercado ao norte de Banguecoque. Vai desde transexuais a executarem rigorosos números de gueixas a miúdos a tocarem xilofone (supostamente para pagarem os estudos), passando por cantores de country tailandês de banjo em punho, a uivarem à lua como se tivessem nascido no Texas. Talvez o visitante ache que tudo não passa de um efeito sórdido da aculturação, ou muito pelo contrário fi que maravilhado e acabe por comprar o CD. Mas o mais importante é a alteridade e esse incrível assalto dos sentidos que Chatuchak oferece a toda a hora.

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