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Petra: Era uma vez uma rosa no deserto

Um pássaro risca o céu e bate as asas para cumprimentar a manhã tão bonita e limpa que me desperta para uma sensação imediata e profunda. Apenas ouço a minha respiração ofegante mas logo vislumbro, ao fundo, recortados contra a cidade mineral, pai e filho, este último montado no dorso de um burro. Quando, finalmente, os nossos olhares se cruzam, trocámos sorrisos testemunhados por uma mulher com um dente solitário e a filha que conduz o quadrúpede e o menino com um cabelo loiro que lhe cai em anéis até aos ombros.

Provando ter um conhecimento técnico extremamente sofisticado, pouco habitual ou mesmo invulgar para uma cultura nómada, os Nabateus, grandes cavaleiros e proeminentes comerciantes, prosperaram durante mais de 500 anos, entre o século IV antes de Cristo e o século I depois de Cristo. Perante tamanha riqueza, os nómadas fizeram vir de Alexandria urbanistas e arquitectos que em muito contribuíram para o desenvolvimento da cidade.

Petra chegou então a ter uma população que ultrapassava as 30 mil almas, um número inusitado quando pensamos nos problemas gerados pela falta de água numa zona onde apenas chove uns dias por ano. Para aproveitarem cada gota preciosa, os Nabateus criaram um complexo sistema de cisternas, canais, canalizações e barragens, bem como um aqueduto com oito quilómetros de comprimento para alimentar o centro da cidade.

Tudo foi feito com tal minúcia que, ao longo das canalizações, os Nabateus não só garantiam o curso natural da água, como também a forçavam a penetrar nas frágeis parcelas de terra cultivadas neste mundo rochoso e árido. Ainda que desprovidos de um império militar e administrativo no verdadeiro sentido da palavra, os Nabateus dominaram uma vasta área que se estendia até Damasco e cuja influência se fez sentir, aos mais diferentes níveis, em Roma.

Eu continuo a subir, a sentir que estou cada vez mais próximo dos deuses, habitando aquele sonho agora que a frescura matinal se começa a evaporar. E, de repente, surgem dois obeliscos de pedra, com seis metros de altura, que assinalam a entrada do Al Madhbah, o altar, local de culto ao ar livre para as religiões semitas também conhecido como Alto Lugar do Sacrifício.

Assumindo o papel de tótemes, os obeliscos sacralizam a esplanada sacrificial, protegida pelas ruínas de uma fortaleza datada do tempo dos cruzados. Aqui e acolá, perscrutando atentamente, destacam-se os regos destinados a drenar o sangue dos animais e do alto do promontório avistam-se, no horizonte longínquo, sob os raios oblíquos e cada vez mais ardentes, a cidade antiga e a cidade nova.

Daqui, seguindo um trilho, chega-se ao Monte Aarão, para se admirar o mausoléu branco construído no século XIV sobre o túmulo do irmão de Moisés e onde Johann Ludwig Burckhardt pretendia sacrificar um carneiro na sua incursão, há 200 anos, por este lugar mágico. Em alternativa, um outro caminho conduz o viajante até ao Vale das Borboletas, passando pelo Monumento do Leão (onde se pode ver com era sofisticado o sistema de canalizações dos nabateus, já que a água, depois de encaminhada, era derramada de uma rocha que encima o monumento com cinco metros para cair perto da boca do leão talhado na pedra), por um conjunto de túmulos e vestígios de palácios, até culminar na Coluna do Faraó, a única que sobreviveu de um templo nabateu.

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