Burckhardt, o homem que redescobriu Petra
Durante séculos, Petra foi um segredo beduíno. A sua redescoberta para o mundo deve-se a um jovem suíço que, aos 22 anos, fugiu da Alemanha, onde estudava, para escapar a credores. Johann Ludwig Burckhardt estabeleceu-se na Grã-Bretanha em 1806, e acabaria por ser contratado para descobrir as fontes do Níger, uma missão tão perigosa que os que a haviam tentado desapareceram. Para melhorar as suas hipóteses, aprendeu árabe, adoptou costumes e vestes, estudou o Islão e o Corão. Para completar a metamorfose, adoptou outro nome, Ibrahim ibn Abdullah. Em 1812, partiu da Síria em direcção ao Egipto, atravessando o que viria a ser a actual Jordânia. Passou por Jerash, Amman e Kerak. Quando chegou a Shaubak, pediu ao guia para fazer um pequeno desvio da rota, porque queria conhecer o Wadi Musa. Ele já ouvira falar de uns fantásticos monumentos que por aí haveria, mas tinha de ter cuidado. Com efeito, os beduínos estavam convencidos que Petra escondia tesouros – que, aliás, procuraram em vão – e pensavam que, se a notícia chegasse ao Ocidente, a região seria invadida por caçadores de tesouros. Ardiloso, Burckhardt convenceu o guia que queria homenagear Moisés, sacrificando um carneiro, e que esse era um dos motivos mais importantes do seu périplo. O guia acedeu, levando Burckhardt ao vale de Petra. Deve ter sido horrível para o jovem suíço passar pelo Khazneh Fir’aoun, pelos túmulos reais e pelas ruínas, dando a impressão de que nada daquilo lhe interessava. “Será que descobri mesmo as ruínas da capital da Petra árabe? Deixo aos helenistas a tarefa de responder”, escreveria mais tarde o suíço. Os helenistas deram-lhe razão e, felizmente, o local nunca foi pilhado.
WADI RUM
O valor do silêncio
A viagem através das areias aproxima-se agora de um novo deserto, o Wadi Rum, que morre em Aqaba, no mar Vermelho. Você conhece este deserto do cinema. Viu-o, por mais de uma vez, em Lawrence da Arábia, o filme sobre o agente britânico que ajudou a revolta árabe contra o império otomano durante a I Guerra Mundial. O deserto apresentado pelos cartazes turísticos, com as suas belíssimas dunas ao pôr-do-sol e de preferência com chá, é tão belo quanto raro.
O deserto é, em regra, áspero e rigoroso, violento e inabitável. O deserto fez-se para ser atravessado. Mas o Wadi Rum é outra coisa. Tem montanhas colossais, com desfiladeiros e gargantas. É um deserto onde o jogo entre as luzes e as sombras dquire proporções fantasmagóricas. E foi o lugar onde nesta viagem os autores aprenderam a verdade dos desertos que se prezam: a vastidão infinita do silêncio que oferecem.
AJILA
A Líbia entre adobe e petróleo
Muito diferente do Wadi Rum, é a imensidão do Sara. Já no Norte de África, em plena Líbia e 400 quilómetros a sul do Mediterrâneo, está Ajila. Há 30 anos não passava de uma aldeia perdida nas areias entre palmeiras. Nem sempre assim terá sido porque aí se situa uma as mais antigas mesquitas do Islão. Custa a crer que a sua construção, em adobe, date do século VIII. É nas sombras acolhedoras deste lugar de oração que uma pessoa entende que o deserto não foi feito para a nossa medida. Que só onde uma fonte de água permite aos homens criar um oásis, ele se transforma num lugar habitável. O interior da mesquita é fresco, apenas iluminado por frestas. Quanto aos telhados, dificilmente poderiam ser mais divertidos: parecem-se com uma assembleia de chapéus de magos.