Foi uma confusão auditiva que deu origem ao nome: o “this lovely planet”, cantado por Joe Cocker na canção Space Captain, trocado por “this lonely planet”. E, mesmo desfeito o equívoco musical, foi essa versão que prevaleceu. Lonely Planet. “Soa bem e este é um planeta solitário, até agora não encontrámos outros planetas com vida”. Quem o diz é Tony Wheeler, o britânico trota-mundos-editor-visionário que ajudou este planeta solitário a mitigar a solidão de algumas das suas partes. Para o bem e para o mal.
Foi há 40 anos que, com a mulher, Maureen, fundou a Lonely Planet (LP), que desde então se confunde com biografia de ambos. Mesmo que o cordão umbilical tenha sido oficialmente cortado em 2011, quando o casal vendeu os 25% que ainda lhe restava da editora à BBC Worldwide (que já havia comprado os restantes 75% e, entretanto, em Março de 2013, vendeu a LP a uma empresa americana). “Chegou o tempo para uma mudança e não ia ser uma dinastia familiar, não íamos passá-la aos nossos filhos.” Além do mais, a criança cresceu e exige outros tipos de atenção — afinal, longe vão os tempos em que a LP era uma “apenas” uma editora de guias de viagem em papel: agora é um conglomerado multimédia em que os guias são servidos em várias plataformas, para além do papel.
“Esta mudança para o mundo digital é algo em que sinto não estar na vanguarda”, explica Wheeler à Fugas, por email. E essa é uma grande parte do caminho futuro da LP, como explica Tom Hall, director de conteúdo editorial digital. A experiência Lonely Planet agora “chega em vários formatos: online, telemóvel, leitores de ebooks e ligação às redes sociais e email”. Não importa, contudo, quais são os meios, porque o objectivo de hoje da LP é o mesmo de sempre: “Fazer guias incríveis que levem os viajantes ao coração de um lugar”, resume Tom Hall.
Tony, o fanático
Porque viajar é preciso e, claro, tudo isto começou com uma viagem. Antes das milhares de viagens da LP, antes das centenas de livros editados e cem milhões impressos, antes dos 250 ebooks disponíveis, dos 10 milhões de downloads das suas aplicações, dos 186 milhões de visitas ao site, houve a viagem inicial.
E antes dessa houve a história de amor: Tony e Maureen conhecem-se num banco de jardim em Regent’s Park, um ano depois casam-se e a lua-de-mel planeada é coisa “simples” — atravessar a Europa e a Ásia de carro para terminar na Austrália. Meses depois, terminada a odisseia, o casal dá por si a escrever a experiência. “Porque tanta gente me fazia perguntas a que pensei poder responder. Porque não havia nada que respondesse a essas perguntas. Porque era uma oportunidade de negócio”, conta Tony Wheeler.
O resultado foi Across Asia on the Cheap, com 1500 exemplares vendidos durante a primeira semana. Para Tony, foi a percepção de que queria fazer das viagens um modo de vida. “Provavelmente deveria tê-lo percebido muito mais cedo, mas aconteceu nessa viagem pela Ásia, em 1972.” Tinha nascido a Lonely Planet, em Melbourne.
O resto, agora é história. Mas houve momentos-chave nessa história, sublinha Tony Wheeler. Logo em 1975, a edição de South-East Asia on a Shoestring, que foi “o primeiro livro ‘planeado’”; em 1981, o guia da Índia, “um livro grande que vendeu mais cópias e a um preço mais alto” do que qualquer outra coisa que a LP tinha feito antes; e, em 1985, o guia da China, a primeira incursão “numa nova grande região do mundo”. Entretanto, em 1984, a editora abriu os escritórios nos Estados Unidos, no que foi o “primeiro passo para tornar a LP numa operação global”. A chegada à Europa foi no início da década de 1990, numa altura em que “a companhia cresceu muito rapidamente” e “parecia que tudo o que fazia funcionava”. Em 1994 deu os primeiros passos na Internet.