As ruas, órfãs de transportes e com as portas do comércio encerradas, são invadidas por dançarinos, músicos, paradas e mascarados. O evento, que se prolonga por quatro dias, tem início no sábado, com a Batalha das Flores, uma parada em carros alegóricos, prossegue no domingo com a Grande Parada, com milhares de festeiros enchendo as ruas com os seus costumes carnavalescos, e dedica a segunda-feira ao Festival das Orquestras, uma maratona de concertos de grupos das Caraíbas.
O último dia, depois de uma noite que parece não ter fim, está reservado para o simbólico enterro de Joselito, o personagem que representa o Carnaval de Barranquilla. O seu corpo é sepultado pelas viúvas alegres que com ele compartilham os dias de festa, uma despedida com um regresso prometido ao fim de 361 dias. Percorrendo algumas das ruas do típico Bairro Abajo, centenas de Joselitos são chorados numa representação cómico-teatral que expressa a dor pelo final dos festejos.
O mundo das rainhas
As bancadas agitam-se, gritos ensurdecedores enchem a atmosfera, misturando-se com a música e os tambores, algo de muito importante, no meio deste espectáculo de cor, está prestes a acontecer.
- Olha que vem aí a Rainha do Carnaval.
A agente avisa-me da chegada mais aguardada, o mistério de tamanho alvoroço entre a assistência contagiada pelos ritmos musicais e pelo constante movimento das dançarinas, com corpos tão elegantes e flexíveis que mais parecem feitos de borracha. Do alto do carro alegórico, Marcela Dávila, estudante de comunicação social e desportista — integra uma equipa de futebol feminino — saúda a multidão em delírio, mulheres dançam no meio da espuma, todas as extravagâncias são permitidas, como se, sob aquele céu pintado de azul, não houvesse lugar para o limite. Os decotes descem e a temperatura sobe, a passagem da rainha provoca um sentimento de alegria mas também, em muitas mulheres, de inveja, de tal forma alimentam, muitas delas, o sonho de um dia serem coroadas.
A eleição ocorre, todos os anos, em Agosto, e este ano a eleita é Daniela Cepeda, uma morena de 23 anos, advogada, concorrente derrotada na edição anterior e que, por força do seu apelido, se viu, logo que a notícia foi tornada pública, envolvida em acesa polémica. A jovem, natural de Barranquilla, é filha do senador e director do Partido Conservador, Efraín Cepeda, correndo rumores, sempre difíceis de provar, de que a alcaidesa Elsa Noguera terá intercedido junto de alguns membros da Junta Directiva, a quem compete definir a vencedora, no sentido de favorecer a candidatura de Daniela Cepeda e, desta forma, expressar a sua gratidão ao pai pelo facto de a ter apoiado nas eleições para a alcaidaria.
Com mais ou menos suspeitas, mais ou menos polémica, Barranquilla prepara-se para viver um ano memorável que, pelo menos aos mais velhos, soará sempre como um eco de um passado glorioso. Conhecida pelo caos urbano e por oferecer escassas atracções aos turistas (com o regresso dos tempos de paz o número já se eleva a três milhões por ano em todo o país), Barranquilla tem feito um esforço para restaurar os seus lugares mais emblemáticos e será, no ano em que celebra os 200 anos da sua passagem a cidade, a 7 de Abril de 1813, a Capital Americana da Cultura.