Fugas - Viagens

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Maputo, ontem e hoje

Estávamos nós a ouvir esta lição (e a reforçar a dose de repelente de insectos) quando apareceu João Baptista, o homem mais velho da ilha. Vai nos 86 anos, o antigo guarda. Falou no calor, na falta de emprego, nos preços elevados, no facto de se ter de comprar quase tudo em Pemba.

Está esperançado no futuro das novas gerações. Muito magro, já curvado, enunciou os lugares que lhe parecem imperdíveis: o forte de São José, na enseada, o primeiro a ser construído; o forte de João Baptista, onde se encarceravam escravos até ao século XIX; o forte de Santo António, o mais pequeno, sobre rocha de coral. E a igreja de São João Baptista, santo padroeiro da ilha de maioria muçulmana.

De forte em forte, fomos percebendo o que resta das antigas casas coloniais, que nalguns casos se degradaram até ruir. Parámos para tomar água numa restaurada, chamada Miti Miwiri, que quer dizer Duas Árvores. Ideia de um alemão e de um luso-francês que andavam a viajar por África.

O luso-francês, Hélder, estava sentado no bar, que se abre para o pátio, a conversar com um amigo. “Eu tinha dois sonhos: primeiro, recuperar uma casa antiga; segundo, viver perto do mar. O meu sócio, esse, sonhava ter um bar. Juntámos tudo e fizemos um hotel, restaurante, bar.”

Decorria 2005. O Parque Nacional das Quirimbas, que, além das ilhas coralinas, compreende uma extensa zona de floresta costeira, fora criado havia três anos. Um era contabilista, o outro consultor financeiro. Agora, nem sabem bem o que são. “Para viver aqui é preciso fazer um pouco de tudo – ser electricista, canalizador, jardineiro, mecânico”, diz Hélder. Tudo pode falhar, tudo tarda. É um outro mundo. “A gente tem electricidade desde Fevereiro de 2012, até aí usava gerador.”

A quem chega, sugere um passeio de caiaque pela baía de Ibo e pela vizinha ilha de Quirimba. Durante a maré baixa, dá para ir a pé, entre os mangais, até à Quirimba; subindo a maré, há que regressar num dhow, barco árabe de vela latina que se usa por aqui. Também recomenda mergulhar nos escombros de um barco afundado.

“Para aqui vem quem não se quer isolar, quem quer interacção com a população local. Viajam com mochilas, comem em restaurantes locais”, explicou o empresário, de 39 anos. “No pico de Agosto, 70 turistas na ilha já é muito. Moçambique é um destino caro.” Mesmo procurando alojamento mais em conta, como o seu.

A beleza natural desperta paixões assolapadas. Ali mesmo, no bar, estava José, um português de 49 anos. Ele e a mulher, Paula, estão a recuperar uma casa colonial para fazer um hotel. “Isto é bonito, tem potencial.” Um era professor universitário, dava aulas de gestão, outro  oficial de contas, fazia auditorias a empresas. “Já andava com vontade. Chegou o momento de fazer uma coisa diferente.”

O desenvolvimento irrompe, depois de anos e anos de quase adormecimento. Entretanto, o conflito entre homem e natureza prossegue. “O parque tem tentado conservar a biodiversidade, mas falta controlo”, elucidou, já depois do almoço, Eliseu, que é de Ibo, embora viva entre Pemba, onde estuda História, e Matemo, onde faz a ligação entre a comunidade e o resort, que emprega 55 ilhéus.

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