Fugas - Viagens

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Brasília é rock

É Fabrício quem nos leva agora ao Teatro SESC Garagem, na Asa Sul, palco de vários concertos míticos das bandas como os Legião Urbana. Lá estão as fotos de Renato Russo nas paredes, multidão a gritar. A particularidade deste teatro a que se acede descendo umas escadas é a bancada ser móvel e permitir várias configurações.

“Isto é um grande templo do rock brasiliense, principalmente para a geração do rock dos anos 1990”, diz Fabrício. Tocaram aqui várias bandas, como Raimundos e Little Quail and The Mad Birds (de Gabriel Thomaz). “Marcou também o show dos Little Quail, uma banda que influenciou uma geração de artistas, e foi memorável, tinha mais gente que capacidade”, lembra Fabrício.

Seguimos para um dos lugares que ele acha serem dos mais interessantes em Brasília, o Centro Cultural do Banco do Brasil, que funciona no Edifício Tancredo Neves, projectado por Niemeyer. É palco de várias exposições, e espectáculos de teatro, mas também de muitos concertos. Durante a Copa, está planeada uma série de exposições com artistas brasileiros contemporâneos, como Vik Muniz, Ernesto Neto, Cildo Meirelles... “Eles querem que seja a nova referência da música brasiliense”, contextualiza Fabrício. “Tem sempre uma atracção musical aqui.” Os Móveis fizeram no CCBB  ensaios abertos do seu último disco, por isso agora aproveitamos para explicar o nome desta banda: uma das versões é que os Móveis fazem homenagem a uma suposta revolta no século XVIII, na ilha do Bananal, contra a tentativa de conquista de ingleses, “em que houve uma junção de índios, escravos negros e portugueses para expulsar os ingleses”. 

É hora de regressar a Legião Urbana e a Renato Russo (1960-1996) – tentamos entrar no Estádio Nacional Mané Garrincha, mas quem controla entradas e saídas é a organização da FIFA. Foi aqui que, em 18 de Junho de 1988, aconteceu o mais conturbado concerto dos Legião Urbana. Vladimir estava no estádio a filmar o show que não terminou e que foi “trágico, porque realmente teve uma repercussão na carreira do Renato Russo”. “Ele não se entendeu com o público e o público não se entendeu com ele”, conta. “A gente estava vivendo essa coisa da transição para o estado de direito, tínhamos saído de uma ditadura e o público também queria se exibir, se afirmar, gritar, aplaudir. Vivíamos um clima de euforia. E ele às vezes dizia umas coisas que o público ia na onda dele e de repente ele cortava pelo pé. Renato foi um pouco irónico e irreverente. Usou droga, primeiro maconha, depois cocaína, depois tomou ácido; no final ele estava assim com aquele gesto; e o público se sentiu frustrado. Ele se desentendeu inclusive com os seguranças do show. Ficou uma coisa traumática. O público expressou o seu descontentamento da forma mais incrível, foi uma pancadaria grande, a polícia batendo no público, e aí o Renato nunca mais voltou para fazer show.” Vladimir lembra-se de filmar cenas de pessoas feridas e magoadas, e de ver o estádio transformado numa enfermaria, “como se fosse um hospital”.

A raiva foi tal que, agora em frente ao bloco de apartamentos onde vivia Renato Russo, no 303 Asa Sul - para onde se mudou em 1972 com a família, vindo do Rio de Janeiro –, é-nos apontada uma parede branca. Estamos perto do posto de gasolina. Vladimir conta: “Alguém veio aqui escrever: Legião não voltem nunca mais!”

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