- Não é longe daqui, mas precisa de alugar um carro, ou de uma excursão, até Cesiak – Centro Ecológico de Sian Ka’an, e lá tratamos de tudo. É a maravilha das maravilhas da natureza do nosso estado [Quintana Roo].
Desconfiei. Os promotores tendem a hiperbolizar o produto, mas a possibilidade de me escapulir ao turismo de massas e atracar o corpo e a mente num lugar encantado e, sobretudo, remoto eram premissas tentadoras.
O agito da noite foi bom conselheiro. Não fossem os altos decibéis projectados das cercanias a conspurcar a minha zona de conforto, e o Hotelito, cujo diminutivo se aplica como um molde, reuniria epítetos vários para redundar no Éden de Tulum.
Cobá depois de Zamá
Guindei o corpo dos lençóis com ganas de participar numa aula mesclada de História e Educação Física. A curta e prazenteira viagem de meia hora de autocarro até Cobá faz-se na companhia de um manto verde, espesso, profundo, ocultando uma miríade de maravilhas da natureza e algumas obras humanas. Tal como em Tulum, a férrea vontade levou-me a chegar ainda a bruma não se levantara da copa das frondosas árvores da selva tropical. Emanada pelos insectos, uma orquestra de sons enxameia os carreiros de terra mal batida. Distingo uivos por entre a sinfonia, ao longe, confirmando a presença de macacos na área. Tento passar incólume mas as paragens para observar aves são uma constante. A lugubridade do espaço confere-lhe uma aura mística, intimidando o visitante solitário. Os braços do sol não logram trespassar a frondosa vegetação, criando-se uma atmosfera ideal para nova temporada da série Lost. Por fim, diante dos meus olhos, Nohoch Mul, a pirâmide que perfura o céu azul matinal, no alto dos seus 42 metros, qual farol de pedra cinzento incrustado no vasto mar de tons selvagens. Cobá foi edificada antes de Tulum ou Chichén Itzá e, segundo os arqueólogos, hospedou mais de 40 mil maias, valendo-lhe o estatuto de uma das maiores cidades do Período Clássico Maia. Sinto-me na guatemalteca Tikal, intrigante até para os estudiosos, por distar mais de 600 quilómetros. Uma aliança matrimonial ou comercial entre ambas as cidades pode explicar as inegáveis parecenças.
De Cobá sabe-se pouco e muito há por escavar. Delicio-me com a amostra, apesar de a ascensão ao topo da pirâmide me avivar quão intrincado é atingir o clímax, ou, neste caso, o topo desta maravilha arquitectónica maia. A inclinação acentuada intimida os vertiginosos. Extenuante, a subida é compensada com a visão dos deuses. Daqui percebe-se por que Cobá significa “água agitada pelo vento” ao vislumbrar pequenos pontos azuis líquidos por entre a ditadura do verde. Um deles é o Gran Cenote de águas cristalinas, outra das razões para o homem se vergar, respeitar e preservar, a obra da mãe natureza — visitei-o no regresso. São perceptíveis algumas das veredas de pedra caliça, os chamados caminhos brancos (sacbés), uma teia de redes comerciais que ligavam o mar das Caraíbas e as cidades estabelecidas terra adentro, com todos os caminhos a reunirem-se em Cobá.