Fugas - Viagens

  • Um castanheiro com mais de 150 anos é um símbolo vivo frente à casa
    Um castanheiro com mais de 150 anos é um símbolo vivo frente à casa Jerry Lampen/Reuters
  • Anne Frank, Amesterdão, 1935
    Anne Frank, Amesterdão, 1935 Reuters/AnneFrank House
  • Um visitante observa páginas do diário de Anne na Casa Anne Frank
    Um visitante observa páginas do diário de Anne na Casa Anne Frank Cris Toala Olivares/Reuters
  • Casa Anne Frank
    Casa Anne Frank Evert Elzinga/AFP
  • Casa Anne Frank
    Casa Anne Frank Michael Kooren/Reuters

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Da casa de Anne Frank via-se um castanheiro

À minha frente está a estante de livros que escondia a passagem secreta para o esconderijo. Uma estante banal, que se movia. E depois o espaço exíguo, tão pequeno e tão estreito, mesmo, onde oito pessoas viveram uma quase vida. O quarto que os pais de Anne partilhavam com a filha mais velha, a sala de estar e cozinha que se transformava em quarto de dormir dos van Pels, o quarto que Anne dividia com Fritz e um pequeno corredor transformado em quarto de dormir de Peter van Pels. Estes compartimentos em dois andares, escadas íngremes. E por fim o sótão, onde não podemos subir, e de onde Anne via o castanheiro a ganhar novas folhas na Primavera, um ano mais bonito do que no outro, anota ela.

Um dia foram traídos. “Favor fazer a gentileza de retirar duas pessoas (dois filhos) que se escondem...” Quem seria? Há várias teorias, nenhuma comprovada. Lá fora era Verão.

O espaço está vazio. Nem por isso impressiona menos. A decisão de não o remobilar foi de Otto Frank. “Durante a guerra tudo havia sido levado e eu queria que ficasse como estava.” Mas o pai de Anne concordou que se fizesse uma maqueta onde se reconstitui o espaço, com o mobiliário, os objectos de todos os dias, tapetes, papel de parede, a secretária onde a filha escrevia.

Miep foi ao anexo depois de as forças nazis deportarem os habitantes. Levou consigo os diários de Anne, que entregou ao pai no fim da guerra. Eram vários diários, na verdade. Vários cadernos e duas versões do diário.

Através do rádio, Anne tinha ouvido um ministro holandês no exílio apelar a que guardassem os seus diários e documentos pessoais como forma de documentar para as gerações futuras aquilo por que o povo holandês estava a passar. Este apelo despertou na menina o desejo de publicar o seu diário sob o título (já escolhido) O Anexo Secreto quando a guerra terminasse. Para isso copiou-o integralmente, reescrevendo partes, cortando passagens, melhorando e comentando. Esse é conhecido como o diário B. Mas aquele que comummente lemos no mundo inteiro é o diário C; ou seja, aquele que foi editado pelo pai de Anne Frank, omitindo aspectos mais íntimos da vida da filha e comentários menos abonatórios sobre algumas pessoas.

O contacto com o diário da filha foi lento, duro. “Não conseguia ler mais do que algumas páginas por dia. As lembranças eram muito dolorosas. Foi uma revelação! (...) Como podia saber o quanto significava para Anne a visão de uma nesga de céu azul, de um castanheiro ou de gaivotas a voar? (...) Não obstante, guardara para si todos estes sentimentos.”

Quase fim da visita. Na casa-museu vemos as páginas de Anne Frank, do diário, de contos que escreveu — ela queria ser escritora —, vemos um filme onde há contribuições de pessoas como Steven Spielberg ou Natalie Portman, contributos de pessoas menos conhecidas que alertam para o que pode ser apelidado de culto da personalidade e para a importância de integrar a história de Anne na história mais negra do século XX. Uma de seis milhões de judeus. Há também o contributo escrito de Nelson Mandela: “Alguns de nós leram o diário de Anne Frank em Robben Island, o que nos trouxe muito alento.”

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