Fugas - Viagens

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Qatar, tão longe do passado e tão perto do futuro

Na base desta mudança está o trabalho desenvolvido pela sheikha Mozah bint Nasser al-Missned, a segunda e de longe a mais mediática das mulheres do emir Hamad Bem Khalifa Al Thani, no poder entre 1995 e 2013, altura em que foi substituído por Tamim bin Hamad Al-Thani. No mesmo ano, Mozah, frequentemente na lista das mulheres mais bem vestidas segundo a Vanity Fair, assumiu a direcção da Fundação Qatar para “a educação, a ciência e o desenvolvimento comunitário”, com um orçamento anual estimado em 11 milhões de euros.

Verdadeira embaixatriz, esta mulher empreendedora percorreu o mundo na tentativa (bem sucedida) de convencer universidades internacionais prestigiadas a instalarem-se no ultra-moderno campus da Cidade da Educação, inaugurado em 2003 numa área que se estende ao longo de 1500 hectares. No Qatar, é cada vez mais reconhecida a capacidade de Mozah para promover o desenvolvimento do mundo árabe no estrangeiro, e as mulheres locais, outrora remetidas a uma vida caseira ou, quando muito, a leccionar numa qualquer escola do emirado, manifestam por ela um enorme sentimento de gratidão, na medida em que a olham como alguém que teve uma importância determinante na mudança de mentalidades. Para os pais, muito arreigados ao passado e às suas rotinas, as filhas têm hoje legitimidade para perscrutar no horizonte um futuro muito mais brilhante — se a sheikha o faz, por que razão as filhas não podem trilhar os mesmos caminhos? Actualmente, as mulheres estão presentes em todos os sectores da economia e representam já mais de um terço da população activa do Qatar, uma realidade insustentável há menos de dois decénios.

Da areia brotou Manhattan

Deixo o Souq Waqif para trás, não sem antes passar pelo souq do ouro e por um outro, mais ruidoso, o souq dos pássaros, onde se pode comprar ou vender (às vezes por milhares de riais) um falcão (e não muito longe daqui está situado um hospital — o Falcon Hospital —, que trata exclusivamente dos ferimentos ou de qualquer doença que afecte estas aves tão intimamente ligadas à imagem do país), à minha direita recorta-se contra o céu o majestoso Centro Cultural Islâmico (mais conhecido por Fanar, que em árabe significa farol e, na verdade, o centro do edifício, crescendo em espiral, tem todas as semelhanças com um farol), aberto em 2006 para mostrar o Islão como modo de vida para o mundo.

Num emirado com poucas mesquitas, o Fanar está longe de corresponder ao modelo de arquitectura qatari para os locais de culto (é uma réplica da Grande Mesquita de Mutawwakil, em Samarra, no Iraque) e é um lugar onde os não-muçulmanos são bem-vindos.

- Não perca a oportunidade de visitar. É um espaço muito interessante.

Com os olhos atrás da objectiva, nem me apercebo da presença de um qatari com as suas roupas de um branco imaculado que me incentiva a seguir em frente, na direcção do Fanar.

- Está com sorte, há uma semana não se conseguia aguentar o calor.

Da minha testa escorre o suor, a temperatura chega, agora, à uma da tarde, aos 38 graus. Aceito o conselho e mergulho num cenário que, embora aberto à oração, também abarca cursos de árabe, de computador, de iniciação à religião, de cultura e jurisprudência islâmicas, de caligrafia árabe, bem como exposições que, mais do que procurarem converter ao Islão, têm como objectivo apresentar a religião na sua verdadeira essência, uma forma de repor a imagem, quiçá distorcida, após os ataques de 11 de Setembro de 2001 — e, por isso, o programa cultural também engloba, entre outros, pratos gastronómicos, jogos para crianças e joalharia feita com pérolas.

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