As noites são de festa acelerada em El Rocío, seja nestas moradias amplas com pátios andaluzes, seja em casas privadas com alpendres voltados para ruas de areia. Porque o turismo é um dos poucos negócios possíveis nesta aldeia católica, além de se venderem velas e imagens da “Blanca Paloma” nas mais variadas formas, também as casas de família são alugadas e transformam-se em dormitórios para 20, 30 ou 40 pessoas. As camas ficam no primeiro piso (mulheres de um lado, homens do outro), já que, rente à rua, as salas de estar são pistas de dança e os varandins são postos de tapas e cantorias. Repetem-se o rum amado da Andaluzia, as sevilhanas, as mãos torneadas por cima das cabeças. O último a sair que feche a porta.
Ressaca e oração
Às oito da manhã de domingo, os bancos estalam de ressaca. “Un café, por favor” e chegam chávenas largas ao balcão para mergulhar o pão torrado. Os olhos bambos preparam-se para a missa das 10h, no Real do Rocío, onde se dá a coroação da Virgem. Até lá, os caminhos são procissões, fotografias sem descanso, irmandades que exibem trajes e estandartes até ao santuário. Maria de vermelho, Rosana de azul, Lola de amarelo. Gargalhadas e cadeiras de rodas. Miúdos de pontapé na bola e padres de crucifixo em riste. Bocas cerradas e olhos em lágrimas – pela fé e pelo pó. Peitos inflamados pelo sol. No fim da celebração e do cantar no peso de um coro afinado, todos tornam às suas casas e cozinhas.
Parece não haver mais fôlego para tanta folia, mas, na verdade, vamos só a metade, ainda que já roucos. O auge das celebrações é de domingo para segunda-feira, madrugada em que a Virgem sai à rua pelas mãos dos irmãos de Almonte, para se encher de pétalas e louvores vindos da multidão. Desmaia-se em El Rocío. Todos querem tocar a imagem do milagre. Uma criança desliza até à Virgem pelas centenas de mãos erguidas ao céu. “Bendita, bendita, mi pequeña!” A criança chora. Nunca andou num carrossel assim, com um milhão de pessoas a gritar por ela. Mas, a seguir-se a tradição, a família há-de tornar à aldeia mágica da Andaluzia no ano seguinte, para mais um caminho, mais uma volta.
GUIA PRÁTICO
Quando ir
A data da romaria varia de ano para ano, sendo o auge da festa na segunda-feira a seguir ao domingo de Pentecostes (50 dias depois da Páscoa). Normalmente, a celebração em El Rocío acontece entre os meses de Maio e Junho. Este ano, o ponto alto é a 25 de Maio, mas a romaria começa pelo menos uma semana antes, com festa pelos caminhos de Espanha.
Como ir
De carro
Cerca de quatro horas separam Lisboa de El Rocío, se as auto-estradas e os itinerários principais forem os caminhos privilegiados. Há três rotas possíveis: de Lisboa até à costa algarvia, atravessando a fronteira em Vila Real de Santo António e seguindo na direcção de Huelva e Almonte; utilizando a A2 e o IP8 para passar por Beja e chegar a Espanha junto ao vale do Guadiana, continuando rumo ao Sul; ou passando pelo eixo Elvas-Badajoz e aproveitando para uma paragem em Sevilha (a viagem é mais longa mas mais prazerosa, para quem vai com tempo).