O brunch é a instituição de fim-de-semana e Williamsburg, o velho bairro de uma decadência boémia dos anos 1940, 50 e 60 a capital deste “vício”. Na última década a classe média tomou conta do bairro e basta uma breve caminhada pelas ruas para perceber porque é que se diz que Manhattan já foi e Brooklyn é que é na nova movida nova-iorquina. Há bares e restaurantes capazes de satisfazer todo o tipo de clientela e, ao contrário de Manhattan, uma maior sensação de proximidade. Muito maior do que a ilha, Brooklyn tem uma densidade de construção e população muito menores. Ali, num fim de tarde ou à noite, parece haver sempre espaço e, mais uma vez, a caminhar, percebe-se a atmosfera que tem alimentado o cinema e, sobretudo, a literatura.
Actualmente, Booklyn — e muito em particular Williamsburg — substitui o Village dos anos 1950, 60 e 70. Incapaz de suportar os custos de Manhattan, uma população de artistas plásticos, escritores, jornalistas mudou-se para ali e alterou a dinâmica local. O efeito dessa alteração está a ser perverso. Brooklyn está na moda e isso tem um preço. O efeito é outra vez a dispersão. Bronx, Queens, e Jersey City, do outro lado do Hudson, já no estado de New Jersey, são alternativas a uma classe média que com ela leva hábitos. É o caso de Alice. Filha de pais argentinos, já viveu em Manhattan, em Caroll Gardens — bairro no centro de Brooklyn — e agora pensa ir para Hoboken, cidade junto a Jersey City, com uma grande comunidade de artistas, oferta cultural, proximidade. Tudo a preços mais suportáveis por uma artesã que vive das peças que faz em cerâmica e vende para lojas e galerias locais.
Alice está sentada numa esplanada no Dumbo, com uma cerveja. Na livraria em frente, a Powerhouse Arena — um armazém com um enorme pé direito transformado em espaço de livros, mais um a revelar a criatividade de livreiros independentes —, está a chegar Karl Ove Knaausgard, o escritor norueguês autor de A Minha Luta. É uma das estrelas actuais da literatura a que os americanos se renderam. Há fila à porta. Na semana anterior, à mesma hora, o crítico James Wood, o homem mais amado e temido pelos escritores — lançava ali o seu livro em mais uma sessão cheia. “É um privilégio poder ter isto à porta”, continua Alice que, como boa americana, encolhe os ombros à pergunta “lamenta deixar este sítio?”. “Quem sabe o que vou encontrar?! Estou sempre à distância de uma breve viagem de metro. E os lugares fazem-se.” O encolher de ombros de Alice não é o de resignação, mas o da capacidade de adaptação e de transformação que caracteriza os nova-iorquinos.
Os que enchem os parques nos festivais de música, nas sessões de cinema ao ar livre, nos terraços de festas privadas, nos bares de cocktails, nos museus, na rua. “Não há cidade mais fácil de conhecer”, escreveu um dia Paul Auster. Ou achar que se conhece ou por estar muita coisa sempre tão visível. “Só em Nova Iorque se pode ignorar um rato que se atravessa no caminho”, escreveu Edmund White no seu livro biográfico de juventude, City Boy. Como falar de uma cidade de que todos falam, de que todos os que passaram por ela escreveram, que está sempre em mudança e que faz dela a sua essência? Como não se deixa de ser redundante a falar das novidades?