Fugas - Viagens

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A pé pelas ruínas de ouro

Subir, descer

É em pleno bosque que aparecem as primeiras vistas das torres laranja que mais não são do que as sobras das montanhas exploradas durante cerca de duzentos anos pelos romanos. Recorrendo à técnica de ruina montium, milhares de trabalhadores livres, e não escravos como muitos pensam, tornaram possível a retirada do ouro que se escondia no solo. A empreitada era gigantesca. A água era transportada através de canais que chegavam a atingir os cem quilómetros e que era depois armazenada em reservatórios, antes de cumprir o seu objectivo final. No interior das montanhas, os trabalhadores escavavam galerias, fechadas na extremidade, e era para aí que, no momento certo, era encaminhada a água armazenada. A pressão fazia explodir a montanha, levando à luz do dia o ouro escondido no seu interior. Observando os pináculos irregulares que se vêem no horizonte e fazendo gestos largos que procuram abarcar toda a paisagem, Miro vai dizendo: “Tudo isto era montanha, tudo isto estava ligado.”

Quando ele fala ao grupo, já deixámos para trás o bosque de castanheiros e a sua sombra protectora. Cruzamos um carreiro estreito pelo meio de fetos tão altos que mal deixam as cabeças a descoberto e subimos por um caminho largo até ao primeiro miradouro do dia, o de Las Pedrices. Daqui, os restos das montanhas arruinadas pela febre do ouro aparecem-nos à direita, algo longínquos, com o povoado de Las Médulas e os seus negros telhados de xisto aos seus pés.

Descansamos um pouco antes de continuar, porque, já a seguir, em vez de seguirmos pela estrada larga que tínhamos usado para ali chegar, depois de atravessarmos o campo de fetos, vamos debater-nos com 500 metros de subida, num terreno resvaladiço, coberto por pequenas pedras soltas. São apenas 500 metros e, visto cá de baixo, nem parece que será assim tão difícil, mas a perspectiva é enganadora e alguns sobem o caminho a medo, inquietos com o solo pouco firme sob os pés. Lá em cima, a 980 metros de altitude, no alto do Reirigo, atingimos o ponto mais elevado do dia e Miro sossega-nos: “A parte dura do caminho já está feita”. São 11h. O que ele não diz é que quanto mais caminhamos mais cansados ficamos e desníveis mais pequenos de terreno acabam por ganhar novos ares de dificuldade que não assumiriam se não tivéssemos já alguns quilómetros nas pernas.

Por enquanto, contudo, estamos todos lá em cima, apreciando a vista larga que se abre à nossa frente. Esta é a zona menos conhecida do parque, aquela que os que se dirigem apenas a Orellán não chegam a ver. Estamos na zona conhecida por Médulas de Yeres e o troço mais complicado do caminho está prestes a apresentar-se.

Porque se subimos, vamos ter de descer, e o caminho é tão estreito que Miro desdobra-se em recomendações. A inclinação também não ajuda e só a segurança das cordas, colocadas em toda a zona mais complicada, facilitam um pouco a tarefa. Devagar, e um a um, os membros do grupo vão abandonando o alto do Reirigo e espreitando, do exterior, uma das galerias abandonadas pelos romanos, depois de o ouro se ter extinguido na região, no século III. Quem vai à frente, procura as zonas de sombra para se sentar e descansar um pouco, enquanto os outros não chegam. Mas a manhã está quase a terminar e, finalmente, a promessa de Miro cumpre-se. Parece que a parte dura do caminho terminou. O campo de merendas de Braña, com mesas protegidas do sol por coberturas leves, está mesmo à nossa frente, à distância de uma descida suave, pelo meio de ervas altas. E a fonte, que nos tinham dito que estava seca, tem afinal um fio de água muito fresca, que com um pouco de paciência volta a encher as garrafas que já se tinham esvaziado.

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