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Silêncio, nestas cidades fala-se de música

Vivíamos no tempo das cassetes, as réplicas locais, lançadas no mercado pela GV, uma subsidiária da EMI, davam a conhecer nomes como a já referida Star Band, a Orchestra Baobab, a Canari de Kaolack, a Royal Band de Thiès, um período baptizado como Belle Époque, na ressaca da descolonização francesa. Nos dias que correm, alguns senegaleses entre a população menos jovem, adquirem uma expressão nostálgica quando evocam lugares enterrados no passado, cenários míticos onde a música ganhava maior expressão, como o Miami Club, do líder da Star Band, Ibra Kassé, ou o Baobab Club. Afortunadamente, errando pelas ruas de Dakar e pelos seus subúrbios, a alma que gosta de música sente-se preenchida no magnificente Théâtre Daniel-Sorano, na Boulevard de la République, ou em clubes como o Tamango e o Thiossane, na área do Point E, o Keur Samba, na rue Jules Ferry, ou o Kilimanjaro, na aldeia artesanal.

Em Dakar, a música é como os táxis: uma e outros estão sempre presentes, ao virar uma esquina ou ao desfazer uma curva; nunca faltam e nunca são de mais; transportam o viandante para outros destinos e outras emoções, tantas vezes viajando juntos – os táxis, com os seus ocupantes apenas movendo os lábios à falta de espaço para mexerem os corpos, o viandante e a música.

Depois de assumir as pastas da Cultura e do Turismo, Youssou N’Dour é agora conselheiro para a presidência, promovendo o país internacionalmente. Não lhe sobra tempo para a música mas a febre do mbalax, tão divulgada pelo cantor em estádios cheios, continua bem viva nas ruas de Dakar.

Cai a noite, todos os caminhos conduzem ao Just 4 U, na Avenida Cheikh Anta Diop, o melhor espaço para música ao vivo na capital. Ao longe, ouvem-se outros sons, outras batidas, toda a cidade parece estar a ouvir a esta hora. E a todas as horas.

HAVANA

- Como bailas bien!

A pequena, com os seus bonitos caracóis, lança-me um sorriso e logo volta a concentrar-se no som, dançando numa sincronia admirável para quem ainda não completou cinco anos. Um descapotável dos anos 1960 rasga o alcatrão do Malecón; a bordo seguem três músicos e um contrabaixo que aponta para o céu pintado de azul; sentado no muro, um casal de namorados, acompanhado de uma pequena aparelhagem, ameaça conduzir um beijo até à eternidade.  

Se, a Dakar, chegavam discos, em Cuba desembarcavam milhões de escravos vindos de África pela mão dos espanhóis, de forma a rentabilizar ao máximo as plantações de cana-de-açúcar. Socialmente, ninguém terá dificuldade em qualificar a atitude dos colonizadores ou em perceber os seus contornos dramáticos; musicalmente, fácil será entender como a presença dos africanos tornou mais rica, em géneros e em ritmos, a música da ilha que já em tempos remotos acolhia compositores da escola europeia, como Miguel Velázquez (século XVI) e Esteban de Salas y Castro (século XVIII), este último uma figura proeminente do Barroco tardio.

A música cubana floresceu e ultrapassou fronteiras no século XX mas já no século XVI se dava início a todo um processo criativo que abarcava o son, clave, habanera, rumba, danzón e guajira. Da música popular e de baile, tão impregnadas na alma e na identidade do povo, nasceram outros ritmos, entre eles o mambo, tocado pela primeira vez pela famosa orquestra Arcaño, bem como o cha-cha-cha, criado por Enrique Jorrín em meados do século passado e com clara influência do son cubano.  

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