Fugas - Viagens

  • A mestre destiladora Lesley
Grace, com a sua longa trança
prateada, é quem nos guia pelo
“Palácio do Gin”
    A mestre destiladora Lesley Grace, com a sua longa trança prateada, é quem nos guia pelo “Palácio do Gin”

Na Escócia, o nosso guia chama-se gin

Por Patrícia Carvalho

Escócia, gin, jardim botânico, campo de curling, gin, casa-cenário de filme de terror, bar, destilaria, gin... Sim, quem preparou o nosso itinerário foi a Hendrick’s.

Royal Botanic Gardens

Há uma névoa ténue enquanto atravessamos os terrenos do Royal Botanic Gardens, em Edimburgo, atrás do nosso guia, Max Coleman. Mas está bem melhor do que no dia anterior, quando aterrámos na cidade escocesa e a névoa era, de facto, um nevoeiro pesado que fazia do castelo de Edimburgo pouco mais do que uma presença de contornos fantasmagóricos na sua posição privilegiada sobre a cidade.

No jardim botânico, a névoa é uma presença persistente, mas leve, e quase não é notada porque o sentimento de todos é de gratidão, por não estar a chover, enquanto percorremos os caminhos ladeados por árvores e arbustos pintados de verde, amarelo, laranja e vermelho. O Outono instalou-se em todo o seu esplendor por ali.

Queremos parar para ver com mais atenção algumas destas árvores de cores fulgurantes e gostávamos de poder ficar mais um pouco a contemplar a impressionante sebe que parece um muro vivo, com aberturas que deixam ver do outro lado um corredor atapetado por folhas caídas, mas Max Coleman tem pressa. O tempo não é muito e ele tem uma missão: mostrar-nos as onze espécies botânicas que entram na preparação de um gin da Hendrick’s e que estão espalhadas pelo jardim.

A primeira paragem é junto à espécie mais importante para a produção da bebida (se ela não estiver presente, não é gin): um arbusto de zimbro. Pegamos nas bagas e podemos trincá-las, deixando que o sabor familiar se espalhe. Não há álcool, não há mais nada ali, mas é o gin que reconhecemos nesta experiência. Depois, entre caminhos ao ar livre ou na grande estufa do jardim — construída em 1858 e continua a ostentar o título de mais alta do Reino Unido — espreitamos as restantes dez espécies usadas durante a destilação de um Hendrick’s: cubeba (pimenta de Java), flor de sabugueiro, camomila, milefólio, coentro, raiz de angélica, casca de limão e de laranja, raiz de lírio e alcaravia (uma espécie de cominho).

E, aqui, pausa para introduzir um tema português na viagem. Max explica-nos que a cubeba foi “banida”, em 1650, pelo rei de Portugal, D. João IV, que procurava impor na Europa o gosto por outro tipo de pimenta. É que a cubeba era produzida na Indonésia, que não fazia parte das possessões lusas, e o monarca queria mesmo é que o Ocidente se apaixonasse pela pimenta produzida na Índia, sob o controlo nacional.

Edinburgh Curling Club

A imagem mais nítida que tínhamos do curling era um episódio dos Simpsons, em que Homer e Marge conseguem arrebatar a vitória para os Estados Unidos da América, num jogo muito atribulado dos Jogos Olímpicos de Inverno. No Edinburgh Curling Club, aos pés do campo de Murrayfield, a pista de gelo está repleta de mulheres de cabelos brancos, vestidas com polares idênticos. Elas fazem deslizar no gelo a pedra que é o centro de todas as atenções e depois perseguem-na, literalmente “varrendo” o gelo à sua frente quando é preciso dar um pouco mais de ímpeto à pedra para que esta chegue ao alvo.

A nossa percepção daquelas velhinhas simpáticas que atravessam o gelo como se nada fosse começa a alterar-se quando nos dizem que a pedra pesa 20 quilos. E muda ainda mais à medida que se vão repetindo os avisos sobre a agressividade do gelo. Ninguém quer cair ali, porque o gelo é agressivo e magoa a sério. Finalmente, já só nos resta a vergonha, quando, já em plena pista, percebemos que aquele movimento de braços, incitado pelo “varre, varre, varre” é mais cansativo do que imaginávamos. Viva as velhinhas poderosas do curling escocês!

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