Festival de Luz
Today I Love You. As letras brancas, de luz, destacam-se na noite na ponte em frente à Estação Central de Amesterdão. No futuro, quem sabe? Mas hoje é assim: I love you. E o amor durará pelo menos até ao final da quarta edição do Festival de Luz de Amesterdão, no dia 17 de Janeiro de 2016.
Mais à frente, noutra ponte sobre um dos canais da cidade, um homem de luz tenta o salto que parece impossível — primeiro corre de braços abertos, depois dá um impulso, os braços para trás, o peito projectado para a frente. A luz parece empurrá-lo enquanto começa a descer, apoiando-se no chão, uma cambalhota, as pernas no ar, e de repente de novo em pé, um braço erguido em sinal de vitória (são vários bonecos que se vão iluminando dando a sensação do movimento).
Andamos um pouco mais e, contra a escuridão da noite, erguem-se duas figuras: o homem verde e o homem vermelho, um caminhando e o outro parado, condenados a nunca se encontrar — Strangers in the Light chama-se esta peça dos holandeses Ina Smits e Victor Engbers. Mas se há desencontros, também há encontros — o húngaro Victor Vicsek criou as Talking Heads, duas cabeças que “falam” entre si apenas por expressões faciais criadas por quatro mil LEDs. É uma conversa através da luz.
Logo de seguida temos a impressão de que o interior das casas se transferiu para fora: o francês Géraud Périole trouxe para a rua os lustres que iluminam as salas de Amesterdão e pendurou-os sobre as águas, onde se reflectem até ao infinito.
À primeira vista, dir-se-ia que Amesterdão no Inverno não precisa de mais luzes. Olhamos para as casas, através das enormes janelas, e os lustres iluminam tudo. Há luzinhas em redor dos arcos das pontes, reflectindo-se em cada canal. Os hotéis, a Estação Central, os grandes armazéns, todos estão cheios de luzes de Natal. Mas, talvez por isso mesmo, surgiu a ideia de fazer entre o final de Novembro e o final de Janeiro um festival de luzes — este ano o tema é a amizade, vista por 40 artistas.
A frase na ponte do início deste texto é uma obra dos italianos Massimo Uberti e Marco Pollice e o salto na noite, com o título Run Beyond, é também de um italiano, Angelo Bonello. Mas há muitas outras obras de luz espalhadas por Amesterdão, parte delas nos canais e a outra parte num percurso terrestre ao qual foi dado o nome de Iluminade.
A Fugas fez o percurso (o aquático) no La Reine, um barco de 1910 que atravessa os canais por entre as esculturas de luz. Numa obra de Vendel & De Wolf (Holanda), as duas cidades de que Charles Dickens fala no seu A Tale of Two Cities erguem-se da água, uma azul e a outra verde (as cores vão mudando conforme os dias), evocando nas nossas cabeças aquele que é o mais famoso início de um romance de todos os tempos: “It was the best of times, it was the worst of times”.
E, noutro ponto dos canais, uma enorme folha de luz flutua sobre a água — é a carta escrita pelo filósofo Espinoza ao seu amigo Lodewijk Meijer, transformada aqui num trabalho sobre a amizade, de Darya von Berner (Espanha). Intitula-se Dearest Friend a partir da frase em latim com que Espinoza inicia a carta: “Amice Suarissime”.