Durante alguns minutos caminhamos por ruas desertas, de velhas fachadas onde, de vez em quando, sobressai uma campainha e a indicação de que estamos perante um dos muito riads da cidade. De repente, surgem dois casais de turistas, cabelos molhados pela passagem por algum hamman, e desaparecem por trás de uma porta pesada. Mais algum tempo e passa um guia, seguido por um casal jovem, a caminho de mais um riad neste emaranhado de ruas vazias dos sons e cores da Marraquexe dos viajantes e turistas. Seguros de estarem em casa, sem a agitação que se agiganta a apenas algumas ruas de distância, dois miúdos riem-se jogando à bola.
Percorremos várias destas ruas, confiantes de que, algures lá à frente, há-de haver uma saída. Mas, afinal, nem todas as ruas da medina de Marraquexe vão ter a algum lado e, depois de esbarrarmos por duas vezes em muros sem saída, acabamos por fazer o caminho inverso, saindo deste nicho sossegado para as ruas de comércio.
Estamos na Dar El Bacha e é aqui que descobrimos algo de que já nos tinham falado, mas que ainda não tínhamos encontrado — o novo comércio de Marraquexe, feito por novos estilistas e designers, que levam à velha capital imperial a modernidade embrulhada em cores e padrões que não rejeitam o passado. A Topolina é exactamente isto. Na mesma rua encontramos duas lojas — uma com produtos para homens, outra para mulheres — da marca criada pela estilista francesa, Isabelle Topolina, que se mudou há alguns anos para Marrocos. As peças de padrões vintage e cortes diferentes cativam os olhos de quem passa, mesmo que os preços estejam muito longe da maior parte da oferta local.
O sol é forte durante a tarde e agora que nos habituamos a uma Marraquexe mais tranquila do que a azáfama a que a velha cidade está associada, queremos continuar a desfrutá-la. A entrada sumptuosa do Palais Donab parece chamar por nós e decidimos entrar. Pode-se beber uma cerveja? Pode, claro. Há um pátio interior, tão típico das velhas mansões marroquinas, com o chão atapetado a azulejo colorido, árvores de fruta que libertam fragrâncias leves e pássaros coloridos em grandes gaiolas, que enchem a tarde de cânticos. E há a água, claro, a água de uma fonte que transmite ao ambiente o constante borbulhar sem o qual um riad ou uma mansão marroquina nunca o serão.
Não está ninguém nas cadeiras de ferro. Não há mais pessoas a apreciar o lento declinar do sol. Só a empregada que traz as cervejas e uma enorme fotografia a preto e branco de Humphrey Bogart, no filme Casablanca, colocada de tal forma que parece estar a olhar directamente para nós enquanto aproveitamos mais uns minutos de absoluto relaxamento.
É ali que saboreamos um pouco mais de Marraquexe, antes de o vento do final da tarde se começar a levantar e o sol esmorecer, indicando que já não vai continuar a iluminar o dia por muito tempo. Voltamos à rua. Sem o fazermos propositadamente, continuamos a evitar a Jemaa el-Fna. Procuramos novo sítio para explorar. Tinham-nos falado de um riad com uma bela esplanada, bem no topo do edifício, e com um mapa muito básico na mão procuramos encontrá-lo. Um marroquino, consciente do nosso ar de quem procura alguma coisa, ultrapassa-nos e, sem parar, pergunta o que procuramos. Dizemos-lhe. “É ali, virando à esquerda e depois à direita, não fica longe”, diz. Mas antes há outra coisa que devíamos ver e que fica só um pouco mais à frente. Uma cooperativa de mulheres que vende belos tapetes, sem compromisso. E tudo isto ele desfia sem nunca parar de andar, dois passos à nossa frente, como se não tivesse importância. E nós sabemos que não será bem assim, que a mostra de tapetes não é só uma mostra, que provavelmente nem são feitos por qualquer cooperativa de mulheres. Mas estamos relaxados, temos tempo e deixamo-nos guiar até um edifício onde, aparentemente, o negócio corre bem, porque várias encomendas estão a ser embaladas, prontas para serem despachadas para as casas dos turistas que observam a operação a alguma distância.