Fugas - Viagens

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Vista cá de cima, Marraquexe é um oásis

Por Patrícia Carvalho

Por Marraquexe, tentando fugir ao óbvio. Escolhemos as esplanadas em pátios escondidos ou no topo de velhos edifícios. Daqui de cima, a cidade tem outro encanto. E damos um salto a Casablanca.

Esqueça a praça Jemaa el-Fna. Esqueça o seu espaço aberto, os restaurantes montados ao ar livre, os macacos, as cobras e as tatuadoras de hena, os músicos e contadores de histórias. Atreve-se a seguir o conselho? Atreva-se. É um virar de costas definitivo ao local mais icónico de Marraquexe, a cidade vermelha de Marrocos? Não. É só um até já, que logo voltamos.

Porque antes queremos ver Marraquexe de outro ângulo. Fugir ao que todos vemos quando nos embrenhamos insaciáveis nas ruas estreitas da sua medina, tão povoadas pelos mais diferentes e coloridos produtos como por motas e bicicletas que surgem de onde menos se espera. Queremos um oásis na cidade velha, um sítio de onde possamos ver o movimento, sem sermos assoberbados por ele. Um local onde a vida flua sem a nossa interferência. Queremos deixar a rua. Olhe para cima, é aí que nos vai encontrar.

Chegamos à Praça Rahba Lakdima, ou Praça das Especiarias, sem a termos procurado. Ela surge-nos, sossegada e colorida, animada e calma, à saída de um dos souks que enchem a medina. Há vendedores sob guarda-sóis, junto a bancas de chapéus de várias cores, cestos de vime, sacos de especiarias, dromedários de brincar, tajines prontas a usar na confecção do delicioso prato com o mesmo nome, doces a lembrar as delícias turcas, de comer e chorar por mais. Algumas mulheres moem, no chão, um pó verde. O que é?, perguntamos. “Hena”, respondem-nos. Há poucos turistas, poucos compradores. O caos que faz parte do encanto de Jemaa el-Fna não chegou a esta praça mais pequena e abrigada, protegida no coração da medina.

Num dos lados da praça, o Café des Épices desenrola-se em vários pisos, terminando num terraço no topo, para o qual subimos, à procura de um lugar com vista perfeita sobre a praça. Encontramo-lo com facilidade. Descobrimos a geometria do mercado montado na Rahba Lakdima, mas descobrimos muito mais. Entre um chá de menta e um sumo de laranja, erguemos o olhar para os telhados à nossa frente e para a cordilheira Atlas, lá atrás, perfeitamente visível e coberta com a neve dos últimos dias.

Ficamos ali, braços apoiados na varanda do café, a deixar que Marraquexe se entranhe. O colorido do mercado, a protecção longínqua do Atlas — está tudo ali, como um país de encantar em ponto pequeno. Mas está mais. Estão os telhados das casas em frente, mal cobertos com placas de zinco colocadas às três pancadas, os inúmeros pratos da televisão satélite e a roupa a secar noutros terraços não muito distantes. Ali está a cidade de que nos tinham falado mas que parece irreal ao nível da rua. A velha cidade onde vive gente. O centro histórico de mansões e casas pobres. A cidade que, finalmente, começa a perder a sensação que nos acompanhara desde que aterráramos — a de que não estávamos num sítio real, mas numa espécie de limbo encantado, montado perpetuamente para nos transportar a um mundo que já não existe.

Gostamos desta Marraquexe e queremos ver um pouco mais dela. Continuamos a caminhar um pouco ao acaso, procurando ruas com menos gente, em busca desta nova realidade descoberta e que não queremos que se perca já, na confusão chamativa dos vendedores de peles, vidros, artigos em metal, calçado contrafeito, bijuteria, cremes milagrosos e especiarias. Sob um dos arcos vermelho-rosa da velha cidade vemos desaparecer uma mota com dois passageiros. Não há gente nem lojas. Seguimos por ali.

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