Ficamos alojados na villa 61, composta por quatro quartos e uma piscina comum. A vista para o mar é incrível e depois ainda há uma infinidade de salas: duas ou três no segundo andar, uma de bilhar, uma pequena copa e um ginásio, e na volta ainda não vimos tudo. Algumas casas de banho são praticamente ao ar livre, resguardadas por uma paliçada de bambu, material que, aliás, está em grande destaque neste eco-resort de 150 hectares por onde nos deslocamos de buggy (também podemos optar por bicicletas). Se é um eco-resort, isto quer dizer, claro, que há aqui bichos com fartura, mas preferimos não pensar nisso, pelo menos por enquanto.
Ou pelo menos até que Amp decida informar-nos da presença de uma cobra. Sobressaltamo-nos, mas ela, a rir, explica que é verde e que “está tudo bem”. “Verde ou vermelha, ok; se for preta, grite!”. Definitivamente, não estamos mais descansados, Amp. Não temos, portanto, outro remédio que não seja entrar neste espírito Robinson Crusoe completamente assumido: até os mordomos à disposição de cada uma das villas se chamam Mr./Ms. Friday. Amp é a nossa Ms. Friday, certo.
Algumas das 36 villas do Soneva Kiri têm acesso directo ao mar, mas “a” praia está a uma curta travessia num barco sempre à disposição dos hóspedes. Bastam menos de cinco minutos para chegarmos ao idílio. Escolhemos uma espreguiçadeira protegida do sol por uma fiada de coqueiros e corremos para a água, quente que quase nem refresca. Tínhamos prometido boiar e é o que fazemos, olhos fixos num céu azul pontilhado por algumas nuvens (ainda há-de chover forte enquanto aqui estivermos, mas não é agora e na verdade a chuva não vai incomodar, antes pelo contrário). Ficamos dentro de água a pensar que esta imensa piscina cristalina, onde de vez em quando vemos cardumes de peixes listados, nos pertence por inteiro: há pouco, os quatro outros hóspedes do Soneva Kiri apanharam o barco, deixando-nos sozinhos nesta praia do Norte. Bom, na verdade somos nós e meia dúzia de galinhas esguias que esgravatam a terra, mais dois cães que dormem à sombra das árvores.
Perdemos a noção do tempo, mas estamos no mar até que os dedos das mãos quase desapareçam de tão encarquilhados. Os três funcionários que connosco permanecem na praia servem-nos água fresca e espetadas de fruta. Precisaremos de mais?
A não ser que nos ofereçam uma massagem no spa e, a seguir, uma aula de meditação que nos mostra que, afinal, talvez seja possível levitar.
Quando subimos as escadas de madeira que nos levam à sala camuflada pelo arvoredo já Vinay Kaushik está sentado no colchão. Imitamos-lhe a postura e ouvimo-lo explicar que o que hoje vamos praticar é ioga nidra — um estado de consciência entre o sono e o despertar que permite um relaxamento total do corpo. Deitamo-nos no colchão e a partir de agora simplesmente obedecemos à voz do indiano Vinay. “Fechem os olhos e concentrem-se na respiração.”
O canto dos pássaros e o restolhar das folhas das árvores torna-se cada vez mais longínquo e a voz suave mas firme de Vinay encaminha-nos para o lugar certo. “Concentrem-se no lado direito do vosso corpo”, pede o professor — e não é que o corpo obedece e quase se levanta sozinho? “Pensem no vosso joelho direito”, e o joelho parece ter vida própria e erguer-se ao comando de Vinay. O mesmo com o braço, o cotovelo, o ombro. O que é que se passa aqui?