Fugas - Viagens

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O "Carnatal" de Kalibo

- Vamos por aqui. Conheço um atalho que nos permite chegar mais rápido ao centro.

Limitava-me a seguir Melinda Augustin mas admirava também aquela paz que os pássaros, riscando os céus, exacerbavam, o mar verde das bananeiras, até que os nossos passos foram conduzidos para uma clareira rodeada de palmeiras e de casas humildes apoiadas em resistentes troncos de bambu onde um grupo de jovens, saudando-nos à nossa passagem, jogava basquetebol (o desporto preferido dos filipinos) com tabelas rudimentares construídas em troncos de árvores que não resistiram ao tempo. Mais à frente, Melinda Augustin deteve-se no umbral de uma porta e ao seu encontro, com um sorriso bonito, veio um menino de tez escura, uns olhos negros, o cabelo ainda molhado, revelando um duche acabado de tomar, decididamente preparado para a festa.

- Este é o Jose Pizaro Junior. Mas todos o tratamos por Toto. Acho que nem dormiu, excitado perante a possibilidade de assistir aos festejos.

Melinda Augustin ligara na véspera, anunciando ao sobrinho a boa nova, e Toto estava pronto para partir, não sem antes me apresentar o macaco que me olhava com uns olhos pouco afectuosos mas que acolhia Melinda Augustin como quem recebe uma amiga de longa data que há muito não via — e na verdade Jack vivera com ela em Boracay antes de começar a perturbar os outros animais e ser enviado para Kalibo.

Juntos, caminhamos agora ao longo de uma das margens do rio Aklan, o mesmo que esteve na origem da toponímia da província, e logo atravessamos a ponte de betão que desagua numa rua cruzada por bandeiras de múltiplas cores, com os passeios já ocupados por bancas de comida e arcas que os comerciantes, preparando-se para um dia longo e de calor, vão enchendo de gelo e bebidas — e para tudo, mas também para os brinquedos, Jose Pizaro Junior, aliás Toto, vai lançando olhares atentos, como alguém que nada pretende deixar de registar na memória. Por todo o lado, vão ecoando os sons festivos, a música, transmitida por colunas que enfeitam os postes, enche a atmosfera, as expressões são sorridentes, como convites à participação na festa que é de todos e que não tardará a ganhar outra dimensão, como se percebe pelo grande número de espectadores que, qual cordão humano, se posicionam já nas artérias onde é esperada a passagem do cortejo.

Matrimónio frenético

Ao fundo da rua, como uma vaga que vai ganhando força, aproxima-se um caleidoscópio de cores e, com ele, o som dos tambores rufando, como um noivado que não tardará a transformar-se num matrimónio frenético, entre o povo, expectante, e os protagonistas, numa excentricidade que não conhece limites.

A multidão agita-se.

Toto coloca-se em bicos de pés e depois, com uma expressão dócil pintando-se-lhe no rosto, ergue os olhos escuros e brilhantes para Melinda Augustin que, por instantes, ergue o menino para que desfrute de uma visão mais abrangente, enquanto procura esconder uma tristeza que parece ter mais a ver com aquilo que gostaria de ter presenciado e não com o que dentro de momentos lhe será dado a contemplar.

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