Fugas - Viagens

  • Sousa Ribeiro
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Uma lágrima, dez praias e mil sorrisos

Um tâmil, com quem me cruzara no mercado de peixe já depois de ter visitado o Salli Muthumariamunam Kovil, um templo com vista para o mar, e de um longo amplexo, do alto da suave colina, à língua de areia da praia de Uppuveli, convida-me para tomar café na sua casa. Leva-me na sua motorizada, pelo meio de uma vegetação grata aos humores do clima, para conhecer a sua família; mostra-me fotografias dos filhos que trabalham na Suíça, mais os buracos das balas nas paredes exteriores, fala-me de horrores, de torturas, encarna no rosto (e provavelmente na alma) uma tristeza que só mais tarde adquire um sorriso, no momento em que, despedindo-se de mim, me deixa na estrada asfaltada que segue para Nilaveli, mais uma das praias onde o viandante não aspira a muito mais do que a uma toalha e durante muitos anos considerada uma das mais belas de todo o país. São quilómetros de areia dourada, uma ou outra infra-estrutura com vocação turística, a proximidade ao Parque Nacional Marinho de Pigeon Island (não mais de dez minutos de barco), um conjunto de ilhotes rodeados de pequenas praias e de recifes de coral que são os mais bem conservados do Sri Lanka. No caminho de regresso à estrada, cruzo-me com um casal já para lá da meia-idade e escuto ecos do passado, a triste realidade de um povo alegre por natureza.

- Olhe para os meus braços. Fico com pele de galinha só de recordar esses momentos. Eu e a minha mulher tivemos de abandonar Unaveli três vezes. Mas está tudo na mesma, com a diferença de que antes havia ruído e agora reina o silêncio. Se eu, por exemplo, viajar de autocarro, lendo um jornal tâmil, os muçulmanos queixam-se. Onde estão os nossos direitos, o acesso à escola e ao emprego serão iguais para todos? Estive três anos e meio preso, fui torturado, pendurado pelos pés ao tecto, conta-me Mattullai Fernando, para quem a vida voltou a sorrir com a ajuda de uns amigos alemães que pagaram a um advogado de forma a poder ver de novo a luz do dia.

Em Maio de 2009, após 26 anos de conflitos entre os militares e o LTTE que terão provocado mais de 70 mil mortos, estes últimos, encurralados, admitiram a derrota — uma estrada de esperança abria-se para todos e hoje, oito anos depois de restabelecida a paz, o país, um dos mais belos do mundo, volta a receber turistas, mesmo no Norte, onde a guerra deixou mais marcas. No espaço de um ano — o primeiro após o fim das hostilidades —, o antigo Ceilão, assim designado até 1972, recebeu 400 mil visitantes e em 2011 esse número subiu para 1, 5 milhões, espalhados um pouco por todo o país e ocupando praias que durante mais de dois decénios não viram um único ocidental.

Trinco e o lingam

Antes de rumar mais para sul, sentado à janela de um autocarro que tantas vezes me deixa ver o mar, dedico um pouco do muito tempo de que disponho para errar por Trincomalee, uma cidade onde vivem umas 60 mil almas e situada mesmo ao lado de um dos mais bonitos portos naturais do mundo. Trinco, para os mais íntimos, acolhe um dos mais importantes lugares espirituais da comunidade hindu, o Koneswaram Kovil, um templo que, por sua vez, abriga o resgatado lingam (um símbolo fálico hindu), conhecido entre os locais por Swayambhu Lingam e com uma história a que estão associados os portugueses — não a conto por agora, ainda tenho de suar até chegar ao lugar que traça as suas origens.

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