Fugas - Viagens

  • Sousa Ribeiro
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Uma lágrima, dez praias e mil sorrisos

Neste país que não pára de me encantar, à boleia, de autocarro, de tuk-tuk, por vezes olhando os estragos provocados, em 2004, pelo mar enfurecido, é já de noite que Arugam Bay me recebe, como se, na sua intimidade, desejasse esconder-me toda a sua beleza até à manhã do dia seguinte.

Nessa noite, iluminada por um ou outro relâmpago que furava as trevas, o meu quarto estava instalado numa árvore; regressava à minha infância e escutava, pela madrugada dentro, o tumulto do mar.

- Era domingo, não havia escola e eu não estava em casa. Foi a minha mulher, meses depois, quem me contou...

A voz embarga-se-lhe e desvia o olhar até à pequena janela que emoldura um mar agora sereno.

- A minha filha mais velha, com 13 anos, estava a tomar banho. A outra, com 10, brincava com o irmão mais novo, de oito. Eram 8h40 quando as primeiras ondas gigantes, com mais de dez metros, levaram tudo à sua frente. Vinte e cinco minutos mais tarde, o cenário repetiu-se e, finalmente, às 9h45, outra vez.

Ramlan Mresuana limpa as lágrimas com as costas da mão esquerda, na outra tem uma faca com que vai cortando os legumes às primeiras horas de uma manhã esplendorosa, em Arugam Bay.

- Morreram todos e a minha mulher, que também estava em casa, foi internada num hospital, em Colombo, onde esteve seis meses em coma.

Ramlan Mresuana recompôs a sua vida, aluga um pequeno espaço onde prepara e serve comida deliciosa — e tem um filho. Mas a recordação trágica daquela manhã de 26 de Dezembro de 2004, quando o tsunami roubou a vida a mais de 30 mil pessoas em todo país, deixando muitos mais feridos, sem abrigo e órfãos, essa Ramlan Mresuana continua a carregar e dela não se desprenderá até aos fim dos seus dias.

Há um único turista fazendo exercício naquela que é uma das praias preferidas dos turistas no Sri Lanka, uma praia pela qual caminho até um riacho me obrigar a desviar para o interior, até uma ponte onde fico a observar os pescadores, as casas que se insinuam por entre a vegetação, bordejando a lagoa de águas dóceis. A estrada corre para sul, chega a Panama, depois a Okanda e, para lá desta, estende-se o Parque Nacional Yala East e a Reserva Kumana, território de pássaros, de veados, de elefantes e, embora mais raros, de leopardos.

O mar, esse monstro

Sou obrigado a um desvio de muitos quilómetros, de Pottuvil a Monaragala, de Monaragala a Hambantota e, finalmente, outra vez tendo o mar como vizinho, chego a Tangalla, a meio de uma tarde que ainda me oferece algumas horas de sol. Sentado numa esplanada, ouvindo o som das vagas, deixo que o dia decline sobre a praia de Medaketiya.

Quando a manhã desperta, anunciando mais um dia glorioso, caminho ao longo de Medaketiya, detenho-me na lagoa, na parte da praia decorada com mais barcos, volto a ajudar os pescadores a colocarem as suas embarcações em zonas mais abrigadas; assisto a todo aquele frémito de vida e inspiro as fragrâncias que anunciam a proximidade do porto de pesca e do mercado de peixe, onde tomo café com os pescadores antes de passar pela Rest House, em tempos ocupada por administradores holandeses, e de me entregar à tranquilidade de praias como a de Goyambokka e Marakolliya.

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