No Sul de Tenerife como no Sul de Portugal
A estrada continua o ziguezague e a natureza faz mais um passe de magia. As encostas enchem-se agora de pinheiros em direcção ao mar. Cabem 22 microclimas nos dois mil metros quadrados da maior das sete ilhas do arquipélago das Canárias. Quase metade do território está integrada em áreas protegidas. Grande parte do que sobra está pejado de prédios, hotéis e resorts.
Só na faixa costeira dos municípios de Adeje e Arona – que incluem núcleos turísticos como Playa de las Américas, Los Cristianos e Costa Adeje – estão mais de 55 mil camas de hotel – cerca de 63% da capacidade hoteleira total de Tenerife. Se contarmos com o alojamento turístico à margem dos hotéis, somam-se quase 37 mil camas. Em 2015, o concelho de Albufeira tinha 47 mil no total.
Em 1975, quando a francesa Catherine trocou o país natal pela natureza e tranquilidade de Tenerife para se tornar guia turística, os dedos sobravam para contar os hotéis erguidos em Playa de Las Américas, recorda. Mas o boom do turismo já dava os primeiros passos no Sul da ilha, tradicionalmente pobre. A explosão construtiva chegou nas duas décadas seguintes. Era o turismo de sol e praia; das enxurradas de ingleses, alemães, espanhóis. No Sul de Tenerife como no Sul de Portugal.
O resultado é um anfiteatro de edifícios e mais edifícios, que ora se vão encavalitando nas encostas, ora se amontoam junto à costa, entre palmeiras sobre os passeios. Nas fachadas das ruas principais é a competição desenfreada das placas e painéis informativos. Olha o restaurante, o bar, o supermercado, a esplanada, o gelado. Olha o parque temático, a excursão, o souvenir. Olha o passeio de barco fresquinho e baratinho. No Sul de Portugal como no Sul de Tenerife.
O clima, a segurança, a relação qualidade-preço e as praias da ilha atraem milhares de turistas por ano. Encontram-se cerca de 70 areais ao longo dos 400 quilómetros de costa, entre praias de areia dourada, branca ou de negro vulcânico. Existem ainda algumas piscinas naturais, em Bajamar e Punta del Hidalgo, por exemplo. Mas de praias só veremos as vistas, ainda despidas das enchentes de banhistas da época alta. Seguimos para a marina de Puerto Colón, onde Salvador e Hans nos aguardam para um passeio de observação de cetáceos.
Entre baleias e golfinhos
“Basta afastarmo-nos cerca de três milhas da costa para conseguirmos avistar animais”, anuncia ao leme Salvador, proprietário da Roulette, empresa de passeios turísticos em veleiro. Os mares do Sul de Tenerife são residência de colónias de golfinhos-roazes e de baleias-piloto, conta, mas podem ser avistadas até 21 espécies de cetáceos por aqui. “Vivem cá cerca de 300 baleias-piloto todo o ano, acredita-se que é a maior população residente desta espécie no mundo”, vai explicando enquanto saímos da marina. “Descem até um quilómetro de profundidade para apanhar lulas gigantes e depois sobem muito rápido à superfície para matá-las com a mudança repentina de pressão.”
Por ser uma espécie residente e muito sociável, é das que se avistam com maior frequência neste tipo de passeios, assegura Salvador. Mas hoje o grupo deve ter ido alimentar-se para outra zona da costa. Das duas espécies de cetáceos residentes só veremos fotografias. Não regressamos, contudo, de olhos vazios em mar. Ainda não nos afastámos muito da costa quando Salvador se empoleira no varandim do veleiro, Hans encoraja o grupo a subir à proa e a preparar as máquinas fotográficas. Está um grupo de golfinhos lá à frente. Ao início, não vemos mais que o marulhar indistinto do Atlântico, mas à medida que nos aproximamos surgem dezenas de animais a saltar sobre as ondas. São golfinhos-pintados-do-Atlântico, com os dorsos repletos de manchas brancas a brilhar na ondulação.