Pensemos no Douro. A região estende-se ao longo de 250 quilómetros e toda ela é considerada uma única denominação para os vinhos DOC, não havendo, na hora de os classificar e aprovar, nenhuma discriminação entre as vinhas. O vinho melhor classificado do Douro pode vir de uma vinha qualquer. Na Borgonha, a vinha é uma imensa manta de retalhos, mas está tudo estudado e definido ao pormenor, um trabalho de minúcia iniciado há mais de mil anos pelos monges de Cister e de Cluny, os verdadeiros criadores do conceito de terroir.
Do intrincado puzzle de denominações existentes, as designações mais básicas, como Bourgogne, Bourgogne Aligoté, Bourgogne Passe-toute-grains e Bourgogne Grand Ordinaire, por exemplo, são mesmo vulgares. Não perca tempo com elas. Num patamar mais acima surgem os vinhos Village, cuja apellation corresponde à comuna onde são produzidos. São vinhos de boa qualidade e com um preço acessível. Alguns são mesmo muito bons. Nos níveis superiores situam-se o premier cru e o grand cru.
Todos os locais com potencial para produzir vinhos de qualidade superior (vinhas bem expostas, com bons solos e boa drenagem) estão classificados como premier cru desde o final do século XIX. Destes, 37 foram definidos como grand cru, por serem os melhores de entre os melhores (sete em Chablis e 30 em Côte d`Or). Dos cerca de 10 mil hectares da Côte d`Or (a grande Borgonha tem cerca de 29 mil hectares), 2090 hectares são premier cru e 450 hectares grand cru. É destes grands crus que saem os vinhos mais caros do mundo, como os lendários Domaine Leflaive (branco), na Côte de Beaune, e o Domaine Romanée-Conti (tinto), na Côte de Nuits.
Romanée-Conti, a vinha das vinhas
Por onde começar? É a pergunta que devem fazer todos os visitantes sem roteiro quando chegam à Borgonha. No caso, foi fácil: primeira noite em Beaune e no dia seguinte a correr manhã cedo para Vosne Romanée, em direcção à La Romanée-Conti, 1,814 hectares apenas, a vinha das vinhas, o nome que faz todos os amantes do vinho suspirar. De Beaune a Vosne são 18 quilómetros, seguindo a “Route des Grands Crus”, uma via panorâmica que passa pelas principais aldeias e vinhas da Côte d`Or. A sucessão de vinhedos famosos é de tal modo avassaladora que é impossível resistir à tentação de saltar muros, de percorrer alguns bardos, de fotografar os pórticos de calcário com os nomes dos domaines, de tirar uma selfie para poder dizer “eu já estive aqui”.
Vosne-Romanée surge logo a seguir a Nuits-St.Georges, onde começa a Côte de Nuits. Continuando, passa-se por Vougeot (famoso pelo Clos com o mesmo nome e pelo imponente château dos Chevaliers du Tastin, uma das várias confrarias da Borgonha), por Chambole-Musigny, Morey-Saint-Denis e Gevrey-Chambertin, a comuna com o maior número de grands crus da região - nove, no total. Todas terras de margas, argila e calhaus de calcários que origem tintos admiravelmente delicados e perfumados. Cruzando Vosne-Romanné na direcção da encosta, la Romanné-Conti é uma das primeiras vinhas que se avistam. De tão fotografada, tornou-se numa imagem familiar.