"Nós queríamos um teatro de bairro, pequeno e de proximidade e os próprios moradores do BA estão a usufruir do espaço", conta Pires. "Ainda no outro dia um vizinho idoso veio cá e dizia "Eu já não saía à noite no bairro há não sei quantos anos"" (veio aos fados ver as estrelas da Mesa de Frades). O próprio António Pires cresceu nas noites do BA - outros tempos de Frágil, Três Pastorinhos ou Mahjong e demais espaços míticos da zona. "Havia um ambiente de criação contínua" que, "hoje em dia, já não existe". Mas aqui, no TdB, "isso está a voltar". "Há muita gente, que já se tinha deixado do Bairro, de regresso e outros novos a aparecer". "Muita gente que encontrava no Frágil ou Pastorinhos, revi-os agora por cá. Não só artistas, também as pessoas dessa movida".
E movida não falta ao TdB: enquanto falamos, prepara-se uma sessão de cinema para meia dúzia de cinéfilos que aguardam à porta; António Pires serve cafés ou ajuda no bar; os actores vão chegando, que há ensaio shakespeariano; o pessoal de apoio técnico vai-se preparando... As máquinas não param.
Depois das estreias em Março/Abril, o TdB está, de facto, imparável, com os próximos meses plenos de garantias: na primeira sexta, ambiente e sons cabo-verdianos com o B.Leza; na segunda com o fado renovado da Mesa de Frades; na seguinte, o jazz do Hot Clube de Portugal; na última sexta, uma noite à Maxime. Além das febres de sexta à noite, conte-se com mais concertos, festas com DJ, programação cinematográfica - pela Zero em Comportamento, o que inclui cinema para os mais novos ao domingo.
E assim, o imponente edifício da Interpress que antes fazia notícias é, agora, feito deste puzzle de eventos que não param de ser notícia. E tudo o que acontece, pelo menos à vista, é na antiga sala das rotativas, onde se mantêm peças desses tempos e os traços de indústria sempre em produção, num sítio que funciona com uma caixa negra para sublinhar a luz do que por aqui acontece.
António Pires guia-nos pelo teatro-que-não-é-bar enquanto pensa na grande estreia teatral do TdB, Sonho de Uma Noite de Verão (após uma encenação de Vida de Artista): "Escolhi Shakespeare para abençoar o teatro", diz. Não é uma qualquer produção, é uma peça "com muitos actores" e todos eles "trabalham aqui": é que no TdB "todos são actores - a pessoa que está na bilheteira, as pessoas que estão no bar, as pessoas que dão apoio, enfim, somos todos actores".
E, também por isso, toda a casa é um palco. Passadas as grandes portas e o átrio com bilheteira passa-se para esse outro mundo, universo a escuro onde brilham atracções várias, incluindo o tal bar de apoio. Percorre-se a passagem superior de acesso, um passeio protegido da sala por uma imensa cortina, e atinge-se a plataforma central, espaço com mesas e cadeiras, sobre as quais se eleva um terraço técnico: serve para todos os controlos de som ou iluminação e para o DJ, quando o há. Lá em baixo, o palco e uma bancada retráctil de cadeiras (que desaparece quando o espaço é usado para outras funções igualmente teatrais, como dançar, por exemplo). Uma reinvenção do espaço, assinada pelo arquitecto Alberto Souza de Oliveira - que, aliás está à volta de outro projecto teatral, com outras dimensões: o da renovação do histórico Capitólio -, onde a criatividade e reciclagem foram palavras-chave: "Nós não tínhamos muito dinheiro para fazer isto e quisemos manter esta característica industrial, de espaço com memória, ligado às pessoas do jornalismo. Não queríamos que isso fosse apagado", diz Pires. "Esteve cá um senhor, o senhor Fernando, que esteve meses a fazer corta-e-cose". Aproveitou-se tudo, cortou-se chapa, reaproveitou-se o que existia no edifício, mantendo e recuperando materiais e estruturas que por ali estavam e peças para decoração e utilidade. "Quer por questões económicas, quer de gosto, manteve-se esta estrutura industrial".
- Nome
- Teatro do Bairro - Isto não é um bar
- Local
- Lisboa, Encarnação, Rua Luz Soriano, n.º 63
- Telefone
- 213473358
- Horarios
- e das 00:00 às 00:00
- Website
- http://www.teatrodobairro.org