A segunda massa eram ravioli recheados com lentilhas ecotechino, um enchido italiano que em Modena tem Indicação Geográfica Protegida. Trata-se de um prato com muito significado para os italianos, que o comem no Ano Novo, acreditando que lhes dará sorte. Simbolicamente, parece que Bottura quis, ao longo do ano, "preservar" esta boa sorte no recheio de uma massa. No prato, a massa estava esplêndida, desfazendo-se na boca como uma nuvem, quase sem necessidade de mastigar, fazendo sobressair as texturas e gostos fortes do recheio. A delicada cozedura terá sido feita em vapor de Lambrusco, um popular vinho local com "pico", que talvez seja melhor em estado gasoso do que líquido... Pena só terem vindo dois ravioli, ainda que de tamanho razoável, porque é daqueles pratos que deixa saudades.
O "segundo prato" era constituído por um peito, uma coxa e uma sobre-coxa de pintada com creme de batata com trufa, vinagre balsâmico, creme da própria pintada e espinafres. É uma criação recente de Bottura, bastante complexa na sua aparente simplicidade, nomeadamente por ter a aparência de um assado sem o ser (o nome do prato é faraona non arrosto), antes cozida delicadamente, sendo que a sobre-coxa é recheada e lacada. À parte, a pele retirada do peito é caramelizada e servida com gelado de natas e chocolate branco do peru, com creme de alho e alecrim. Tive ainda direito a ser pulverizado com um spray com aroma de assado, que acentua a ilusão de estarmos perante um, mas não surtiu o efeito desejado. Seja como for, é um prato de que guardo boa memória.
A primeira sobremesa estava deliciosamente original, com um "gelo", que mais parecia uma nuvem, de maçã verde e pepino, sobre uma "terra" de frutos do bosque, avelãs e outros frutos secos. Depois, uma crostata com gelado de erva-Príncipe e zabaglione de limão, bastante razoável e, por fim, um macaron (que parece também ter tradição local) de foie gras, uma má maneira de terminar a refeição, misturando gordura e doce. O que vale é que ainda havia umas fantásticas mignardises para acompanhar o café.
Na parte das bebidas, pedi um menu de vinhos (50 euros), que teve a curiosidade de começar com uma óptima cerveja artesanal de Bolonha, a Beltaine. Aliás, os italianos, como pude comprovar nesta viagem, estão obcecados em produzir cervejas artesanais e há algumas notáveis. Vieram depois três brancos e um tinto, todos italianos e de pequena produção, de que não tomei nota, mas que justificaram plenamente ter recorrido à orientação do chefe de sala e escanção. Diga-se que a carta de vinhos é muito extensa e os apreciadores certamente que encontrarão nela excelentes e variadas garrafas. No total, o almoço ficou em 215 euros por pessoa, o que é bastante razoável para a qualidade do que se comeu e bebeu.
Concluindo, não foi certamente o quarto melhor restaurante onde estive, mas não há dúvida de que se trata de uma cozinha muito bem pensada e executada, embora algo introspectiva, que talvez devesse brilhar mais em termos de gosto, mas que demonstra que Massimo Bottura merece sem dúvida ser seguido de perto. Eu já prometi a mim mesmo lá voltar quando puder, agora mais informado sobre o "território mental" do chef, mais capaz de compreender esta cozinha única.
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