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    Hotel Victoria, onde fica instalada a selecção portuguesa Vasily Fedosenko/Reuters

Donetsk: Minas, camaradas e oligarcas

Por Miguel Gaspar

A cidade dos oligarcas que dominam a Ucrânia nasceu em 1872. A sua história é contada por três homens mas as minas de carvão e as fábricas são a verdadeira marca da cidade. Isso e o futebol.


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Quando embarcámos no avião para Kharkiv, a surpresa eram os americanos. Eram às dúzias e até parecia que a CIA ia a caminho para ganhar a Guerra Fria (com 20 anos de atraso). No autocarro que se faz à pista no aeroporto de Kiev, rumo a Donetsk, o ambiente é mais Versace e há mesmo uma carrinha para levar os passageiros VIP. Mas não nos fiemos nas aparências.

À chegada, a pista ainda está em obras e o terminal novinho em folha, feito para o Euro 2012, continua por estrear. O autocarro que transporta os passageiros é ultrapassado pelo carrinho que leva... as malas. Olha a minha mala, pensei. Minutos depois estava a tirá-la à mão, na pista. Bem-vindos à cidade do dinheiro e dos oligarcas que dominam a Ucrânia.

Estão 25 graus, um inesperado calor de Primavera que torna mais sufocante a viagem por entre o trânsito caótico, os dormitórios degradados, as lojas enfiadas numa espécie de pequenos barracões à beira das ruas como as que existem por todo o país.

Chegados ao centro, tudo muda de figura. As grandes avenidas passam a ser limpas e floridas, o espaço público está muito bem cuidado, há esplanadas frescas e magníficas, bares e restaurantes que desafiam a ideia de que os preços na Ucrânia são baixos. Os prédios da era soviética, da ópera em estilo neoclássico aos edifícios do Estado, pesados e severos, são ultrapassados por torres de vidro, centros comerciais, novos hotéis, edifícios de escritórios em construção. Há Porsches e Ferraris a picarem-se ao longo da Artemia Street, a avenida principal. "O parque automóvel aqui é melhor do que em Kiev", diz, orgulhoso, Zoltan, o meu guia, um jovem estudante deliciado com uma nova ocasião para praticar o seu inglês.

Também há uma estátua de Lenine no centro e ruas Karl Marx para os Lamborghini passearem. Continuamos na Ucrânia que fala russo, no território onde obrigado se diz spazebo e não diakoyu. E onde nem toda a gente aprecia que os filmes russos sejam... dobrados em ucraniano. Explico a Zoltan ao que venho e a resposta é desarmante. "Em Donetsk não há nada para ver. Os turistas não vêm cá fazer nada." Tem razão. Donetsk é um estádio de futebol em cima de uma mina de carvão. E eu sinto-me mesmo o único turista por estas paragens.

Mesmo sendo uma cidade sem memória, Donetsk tem uma história para contar. Este centro mineiro e metalúrgico nasceu do nada no século XIX, foi vital para a economia dos czares e da União Soviética e hoje faz a chuva e o bom tempo no país. Esse passado pode ser resumido através das histórias de três homens: um empresário galês, James Hughes, um mineiro soviético, Alexei Stakhanov, e o maior dos oligarcas da Ucrânia, Rinat Akhmetov. James Hughes é o fundador da cidade: desembarcou no que então era o sul da Rússia com operários treinados e material de exploração mineira. Fora contratado pelo czar Nicolau II para começar a explorar a bacia do Donets, hoje conhecida como Donbass. Chamou Hugheshovka (ou Yuzokva) à cidade que fundou, em 1872, e trouxe para os confins da Ucrânia as casas em tijolo britânicas e uma igreja anglicana. Mas pouco sobra da memória de Hughes na cidade e a casa onde viveu (em tijolo vermelho) é apenas mais um edifício perdido numa Donetsk muito diferente da Yuzovka que fundou.

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